Cavalos Alados - Jorge Castro

Senhor... Porque não fazes de minha vida um sonho?
Diga-me, ó pai, por que fizestes tudo tão real?
Porque não me crias um lugar que puxe meu sorriso tanto quanto a minha mente?
Caso não tenhas percebido, aspiro por magia, cada dia mais.
Vivo apenas pelo surreal, o impossível.
E, no entanto, vejo-me contentando-me com uma máquina cinzenta.
Um ser robótico que, incrivelmente, fornece-me ar...
Seu ar sem cor e sem voz, que tenta me manipular assim...
Se me tiras a magia, ó pai, tira-me mais que a vida.
Assim, sem escudos reluzentes, sinto-me mais que vulnerável.
Sem minha humilde rocha d’água, sou incapacitado de guerrear.
Guerrear contra a monotonia que se alastra com tentáculos nas sombras.
Guerrear pela luz do cetro que flutua dançante sobre a floresta esquecida.
E, ainda assim, percebo que me foi tirada a espada,
Roubada, dos trovões, a adaga. E levada, do mundo, a mágica.
Reparo, então, no pequeno canto cinza que luto para que se vá.
Mas, como o resto da tempestade, o pequeno insiste em ficar.
E, sem meu cetro ou a pedra d’água, não posso sequer tentar.
Senhor, ainda assim, te suplico...
Não tire a mágica que sinto, ou sei que não vou mais voltar.
Devolva-me o escudo polido, eu suplico, que com o cetro eu ei de usar.
Purifique a espada cansada, pai, antes de o cetro me tirar...
E me faça uma nova pedra, senhor, que a antiga sem mágica está.

Lua escura - Parte 4

Meu estômago se remexia de tempos em tempos, ameaçando me devolver meu almoço daquele mesmo dia. Se eu pudesse, voltaria no tempo. Para, exatamente, três semanas atrás, e então teria ignorado a minha maldita vontade de jogar com os espíritos.
Sinto-me tão idiota... Sei que, segundo a lenda, tudo isso estava prescrito para acontecer, mas sei também que aquele jogo piorou muito a história para o nosso lado. Tudo seria mais fácil... Ainda teríamos alma. Não essa que adquire a forma de um animal qualquer e possui uma cor própria, mas aquela espécie de luz que cerca nossa matéria, nosso corpo.
Mas eu tinha mesmo que estragar tudo... É tudo culpa minha... Tudo isso. E agora eu pagaria cruelmente pelo estrago que fiz.

------- Inna:

— Vamos, rápido! — gemeu Mickaella, enquanto arrastávamos uma segunda estante para bloquear a porta. Após cinco minutos de tensão e suor, conseguimos arrastá-la, assim como a primeira.
— Deve haver uma porta dos fundos. —Sugeri, ouvindo mais alguns ruídos provocados pela serra elétrica que a mulher de cabelos loiros e olho cinza-claro portava do lado de fora da construção. —O que faremos? Se eu tentar falar com Tie mais uma vez, vou desmaiar. E então será você tentando fugir e me carregar.
— Precisamos apenas de uma distração... Algo que a deixa ocupada enquanto pensamos em um jeito de fugir. — Outra vez o som encheu o ambiente, e as duas estantes de madeira balançaram, juntamente com a porta de aço. — Graças a Deus decidiram fazer uma loja de cimento, e não com vidraças. — E então se ouviu um grito seguido por um choro, uma criança. Havia uma criança lá fora, e não deveria ter mais de cinco anos.
Eu e Micka nos encaramos, completamente assustadas. Não poderíamos deixar que uma tão inocente alma morresse por algo que não merecia. Por algo que não foi ele quem provocou. Assim que minha amiga de cabelos com pontas verdes começou a mover os lábios, eu já sabia exatamente o que ela diria:
—Vamos nos arriscar!
Sem perder tempo, arrastamos para o lado às duas estantes que nos serviram como proteção, e chutamos juntamente a porta dupla, saindo para um lugar repleto de tanques de gasolina e outras coisas explosivas. Mas, curiosamente, não havia ninguém lá.
A noite estava mais uma vez em completo silêncio. Alguns grilos cantavam aqui e ali, provavelmente nos arbustos que decoravam a cidade. Observei a lua, e depois as estrelas. E então algo que quase me matou de susto: De cima do telhado da loja de onde havíamos acabado de sair, uma mulher com uma serra elétrica carregava, pelo pescoço, um menininho de cabelos ruivos e roupas de marca. O garoto estava desmaiado, mas não morto, e a estranha moça estava prestes a parti-lo em dois. Ela aproximou a arma do corpo do garoto, quase encostando no minúsculo corpo, o que já pareceu lhe desconfortar mesmo estando inconsciente.
—NÃO! — Gritei, sem conseguir conter minha fúria. Para mim, o mundo vibrava agora, como num terremoto, mas eu sabia que isso era puro efeito da raiva em excesso. Minhas palavras ecoaram noite afora, chamando atenção da materializada em cima da loja, que agora ameaçava jogar o menino daquela altura. — DEIXE-O EM PAZ, É AMIM QUE VOCÊ QUER SUA MALDITA! VENHA ATÉ NÓS E O LIBERTE, COVARDE!
A mulher apenas riu, balançando descuidado o corpo que segurava pelo pescoço, o que me fez vibrar ainda mais.
E então uma grande luz surgiu a minha frente, brilhando em um tom cinza, se concentrando em um globo iluminado de mesma cor e que liberava fumaça no mesmo tom a sua volta. Era, resumidamente, um globo de luz que deixava, por onde passasse, uma espécie de fumaça de mesma coloração que o seu núcleo.
A mulher, assustada assim como eu, se desintegrou em uma fumaça negra e deixou o menino cair. Este que, estranhamente, caiu leve como uma pena em cima de algumas plantas que cercavam a loja de conveniência.
O globo de luz desceu lentamente até encontrar o chão, então começou a se esticar e afinar. Após alguns segundos, o que havia na minha frente não era algo sobrenatural. Na verdade, me parecia uma simples e acinzentada... Fuinha.
— Inna... Isto é... Quer dizer... É...
—A minha... Aura?

Ficamos escondidas atrás de um grande caminhão até que o menino despertasse. Agora eu tinha minha própria aura... E era um dos meus animais preferidos. Tudo seria diferente, inclusive nas batalhas. Paul uma vez me explicou que uma aura é, por bem dizer, parte da força espiritual de alguém, de modo que se ela morrer, parte de sua vida também se perde. Mas, enquanto estivesse ao seu lado, sua aura seria capaz de dobrar sua força e, em alguns casos, velocidade. Mas isto apenas para quem a treina adequadamente... Nada que aconteça com esse grupo de adolescentes...
—Precisamos encontrar os outros! — Sussurrou Micka, agachada com o menino no colo. — Onde será que...
—Meu filho! — Gritou uma dama de vestido vermelho e cabelo ruivo em coque do meio do asfalto. — O que vocês fizeram com o meu bebê? Dê-me ele!
—Senhorita Wishburg? — Perguntei retoricamente assim que reconheci as feições doces e joviais de nossa professora de sociologia.
—Oh, senhor, o que vocês fizeram com o meu...
—Não fizemos nada com ele! — Respondi, nervosa. — O vimos caído na loja de conveniências e pensamos que seria melhor mantê-los conosco até que o pesadelo que está sendo esta noite acabe.
—Bem, já podem me devolver! — Respondeu a professora, parecendo ignorar completamente o meu breve discurso explicativo. — de qualquer forma, agradeço a proteção, e muito obrigada por encontrarem ele! — Por fim, soltou um rápido sorriso, pegando o garoto no colo e correndo para a limusine branca que a levara até ali. — Vamos bebê, papai está nos esperando...
O automóvel se movimentou após alguns segundos de silêncio, saindo do cenário assim que dobrou a segunda esquina. Voltei-me para Micka, que olhava atentamente por baixo do caminhão.
—Tem um homem lá... — Disse, levantando-se rapidamente com sua respiração levemente mais ofegante que a minha. —Está mordendo o pescoço de uma mulher inconsciente!
—Já chega, isso tem de acabar! — Disse, socando o material que constituía o caminhão e me levantando. Caminhei até o posto novamente, com passos decididos e minha nova fuinha tentando acompanha-los. — Hey, você! — Disse, chamando a atenção do homem, que agora largava o corpo desacordado aos seu pés. Era um moça linda, de mais ou menos um metro e oitenta de altura de cabelos cacheados e castanhos. Já o homem, também lá para os seus um metro e setenta, tinha olhos negros e secos, e uma boca por onde escorriam vários pequenos rios rasos de sangue. Seus dentes, que mais lembravam os de um tubarão, também estavam tomados pela vermelhidão. Passei por uma caixa de mecânico largada ao lado de um dos tanques de gasolina e agarrei a primeira coisa longa e pesada que encontrei. Ótimo, era um enferrujado martelo! — Venha me pegar, cretino!
O homem realmente correu em minha direção, com as mãos sujas de sangue a mostra e seu pescoço repleto de arranhões profundos. Sua camiseta estava aos trapos, suja de terra aqui e ali e com rasgos enormes na barriga e nas mangas. Igualmente com sua calça de malha.
O rapaz logo estava a quatro passos de mim, quando preparei meu martelo e o joguei com força na direção de sua testa.
— Argh... — Gritou, assim que o ferro perfurou e permaneceu cravado próximo a onde começava os primeiros fios de cabelos levantados em um topete.
Pisei com força sobre seu peito e arranquei bruscamente o martelo. Assim que ele tentou se levantar, ataquei-o mais algumas vezes, socando com o martelo na área entre o nariz e a testa. Logo, o que há duas semanas atrás me deixaria nauseada, um buraco por onde o sangue jorrava havia se aberto, e o corpo estava sem vida alguma.
Joguei o martelo enferrujado ao lado do corpo, e então me virei para onde Micka estava. Meu mascote estava entre nós duas, correndo na direção de minha amiga. Agarrando-a por trás havia outro homem, um pouco mais novo que o que eu acabara de matar e que se desintegrava em fumaça enegrecida. Na verdade, eu reconhecia aquele garoto. Era tão próximo quanto um mosquito qualquer, mas ainda assim era conhecido.
Ela tentava se livrar dele, mas ele era forte de mais. E havia a agarrado de forma que ela mal conseguia se mover. Seu rosto me passava agonia, e isso me enfureceu mais ainda.
—Andrew! —Gritei, correndo para tentar afastá-lo. Até que alguém, silenciosamente, agarrou a cabeça do garoto que assediava Micka e a girou, quebrando o pescoço do rapaz.
Assim como Micka, não pude deixar de conter um grito. Não fui rápida o suficiente para ligar meu raciocínio de sempre. Chilly parou na mesma hora, voltando a ficar do meu lado.
—Morra, maldito espírito fugitivo! — A voz que soltou essas palavras era dócil embora decidida. O que me assustou. Assim que o corpo do garoto caiu, pude perceber as feições delicadas e gentis de... Senhorita Wishburg? Espere... Mas...
— o que está fazendo aqui? — Perguntei. Em minha cabeça, um verdadeiro nó crescia a cada minuto. — Vimos a senhora sair com seu filho não faz dez minutos. Como pode...
—Charles? ENTREGARAM CHARLES? — a professora agora trincava os dentes, batendo com o pé no asfalto frio. — Não acredito que caíram nessa! Como podem ter sido tão idiotas? Vocês entregaram meu filho à um materializado! ENTREGARAM O MEU FILHO?
— Como sabe sobre... Espere... Você acaba de matar Drew!
—Mais uma vez, um materializado, não Andrew! — respondeu, retirando de sua bolsa negra um pequeno livro desgastado, totalmente negro com o símbolo de um sol rachado no canto inferior direito. — Quanto a sua “quase” pergunta: Acompanho May Crommwell há muito tempo. Sempre estive a espera da nova geração...
— Do que está falando? — Perguntei, puxando Micka, que permanecia encolhida e paralisada, para que ficasse de pé ao meu lado. — Como pode saber de tudo isso?
—A guerra do eclipse não gira em torno exclusivamente dos Crommwell. Existem outras famílias de bruxos, como por exemplo, os Winngle, da América do Sul. Ou... Os Wishburg.
Meu mundo parecia que estava a ponto de desabar. Todo esse tempo, sabíamos da existência de outras bruxas, como as famosas “da causa”. Mas, famílias inteiras e, ainda por cima, vivas... Saía completamente das explicações de Celly.
— Há muito tempo, um velho feiticeiro foi derrotado por quatro autênticos bruxas e bruxos. Com seus domínios sobre a natureza, ele esperava vencer do grupo enterrando-os junto com raízes de grandes árvores. Mas, então, um dos bruxos foi mais rápido do que ele... — A professora parou, como se estivesse vendo uma cena que só ela conseguiria enxergar para, depois, passar os dados corretos às crianças. —Joseph Crommwell incendiou todo e qualquer tipo de ser vivo próximo ao campo de batalha. O feiticeiro, que havia aprendido dois dos quatro elementos, provocou uma forte chuva. Mas então já era tarde demais... Não havia lagoas ou rios por perto, e as árvores se tornaram dúzias de carvões gigantes. Em seguida, Giselly Winngle, que passou anos especializando sua magia no controle de animais, fez com que lobos chegassem ao local... Lobos famintos e terríveis, que logo avançaram no pobre feiticeiro. Terminando o serviço, enquanto o que sobrou do oponente ainda conseguia respirar e raciocinar, Tanaya Wishburg e Wilbur Conoveiar o envolveram em um pequeno espiral de fogo, que o tomou rapidamente, incinerando-o. Mas, segundo antes de perder completamente a vida, o feiticeiro encontrou forças para lançar lhes uma maldição.
Inna ficou paralisada, e sentia que Micka estava a ponto de desmaiar, se não coisa pior. E sua fuinha, Chilly, parecia prestar tanta atenção à conversa quanto as meninas. Talvez até mais.
—Suas palavras... “Enquanto houver um único pinheiro vivo, ou uma única tulipa crescendo, o destino se encarregará de tirar-lhes a vida, um por um, de forma cada vez mais dolorosa.” “Quando o Sol e a lua se encontrarem, soltando sua primeira onda de magia, cada família perderá um de seus pecadores.”. Assim, um único trovão tombou o céu, seguido de uma terrível tempestade que chegou há durar três dias.
“Joseph Cromwell resolveu fugir. Juntou suas poucas coisas e convenceu sua mulher e seu casal de filhos a segui-lo. Saindo da Europa, Os Crommwell e os Wishburg chegaram, juntos, à América do norte, separando-se das outras duas famílias, que foram para a América do Sul.
“Mas o destino revidou... Três dias depois de sua chegada, Joseph foi queimado vivo por integrantes da igreja católica. Logo depois, sua mulher teve a mesma morte, mas ordenou que os filhos fugissem a tempo. Dayana e Thiago passaram a morar com os Wishburg, que logo foram atacados também. A igreja incendiou a fazenda da família, onde todos morreram, exceto Tanaya, sua filha de dezessete anos, e as duas crianças da família Cromwell. Desde então, a vida de ambos se tornou uma constante fuga, e até a geração passada foi essa mesma luta. Até que a igreja perdeu boa parte de seu poder... Mas a natureza não deixou barato.
“Assim que os descendentes pensaram estar livres, a maldição do feiticeiro realmente passou a ataca-los, fazendo com que todos se voltassem contra eles no primeiro eclipse do ano. O que nós gostamos de chamar de “guerra do eclipse”. A cada guerra, algum bruxo de alguma das famílias era morto de forma extremamente violenta. Se não bastasse, surgiu outra espécie de humanos. Os encarnados, espíritos rejeitados, foram trazidos a terra, e apenas seriam livres novamente se completassem sua missão: Matar algum bruxo de uma das quatro famílias mais poderosas durante a guerra.
—E assim nasceu o terror dos Cromwell... — Disse uma voz melosa de trás da professora. Assim que percebi, Marianne estava ao lado da outra mulher, com um sorriso de deboche estampado na cara e seu típico vestido vermelho colado de tecido desconhecido.
—Inna! — embora o susto, consegui distinguir de onde vinha o som e olhei na direção de onde achava que vinha. Percebi que ambos no cenário fizeram o mesmo.
Virando a outra esquina, quase chegando até nós, Paul, Tie e May corriam ofegantes em nossa direção.
—Isso é o que eu chamo de encontro às escuras... — Ironizou Marianne.

(Continua...)

Lua escura - Parte 3

Senti uma extrema náusea assim que o bafo de morte invadiu meu espaço. Quase sem sucesso, tentava afastar o garoto-tubarão pondo meus braços entre nós dois. Agora estávamos caídos na calçada, ele tentando apenas me envenenar, mas ainda não havia conseguido cravar os dentes em minha pele, graças a Deus.
Por um instante, ao desviar os olhos, percebi que outro indivíduo da qual não me recordava à memória distraiam May e Tie, com sua ira praticamente visível. Só então percebi que não teria algum apoio naquele momento... Teria de aprender a me livrar daquele defunto sozinho. Deixei um de meus braços entre meu corpo e o outro ser caído sobre mim, enquanto tentava pegar alguma das duas facas com o outro.
Ouvi os gritos à minha frente: “Largue-o!”, “May, o punhal, pegue o punhal!”, “estou tentando recuperá-lo!”. Minha pele formigou. Eu precisava ajuda-los, ou seria tarde demais. Preciso me livrar de Heath...

----------- Paul:

Enfim, alcancei uma das facas negras. Com algum esforço, consegui tirá-la de meu cinto, percebendo que meu outro braço estava a ponto de ficar dormente. Não me lembro de sentir alguém tão forte a ponto de me machucar. Mas, afinal, a culpa é do Halloween.
Consegui! , Pensei, erguendo um pouco a faca e enfiando sua lâmina de trinta centímetros na nuca do garoto morto. O mesmo lugar em que ele havia sido atingido há algumas semanas para conhecer a própria morte. Após alguns segundos joguei o corpo sem vida ao meu lado e observei-o desintegrar em uma luz enegrecida.
Levantei-me a tempo de ver May e Tie acabarem com três daqueles seres, que também desapareceram em uma luz negra. Os dois se puseram rapidamente ao meu lado, ofegantes assim como eu.
—Você está bem? — Perguntou-me a bruxa, ainda com o punhal na mão.
—Sim, e vocês?
—Precisamos sair daqui... — Rosnou Tie, também segurando sua arma. Só então me dei conta de que deveria segurar minha outra faca também, e assim a fiz. — Temos que nos esconder Paul!
— Eles nos encontrarão se nós nos mantermos parados em um lugar fixo, e então ficaremos cercados.
— E o que sugere? — Perguntou May.
— Vamos continuar fugindo, temos que encontrar os outros!
— Que outros? — A voz surgiu atrás de nós seguida por um riso maléfico.
Lentamente, nos viramos. Estávamos com medo de ver o que nos esperava, e com razão. E lá estava ela: A dama das aranhas. A mesma que o homem misterioso de aura branca havia matado para nós, na velha mansão.
Erguendo uma de suas mãos, a mulher trouxe a vida alguém que proporcionava realmente medo a nos três. Senti May repreender um grito assim que percebeu o que a dama estava fazendo, e Tie deu um passo atrás, parecendo ter ficado sem ar por um instante.
E então, a apenas alguns muitos poucos metros de distância, ele gritava de fúria. Pegou um grande machado prateado de seu cinto e gritou, o que realmente abalou nossos espíritos.
— Occ... Occino... — Conseguiu dizer May, antes de ter uma rápida paralisia.
— Eu gostaria de poder brincar com vocês... Mas preciso rever um velho amigo e seu pequeno tigre... — Um sorriso de prazer tomou a mulher, que logo voltou à realidade. — Occino, acabe com eles! — Gritou, antes de desaparecer em uma fumaça quase invisível.
O gigante começou a vir em nossa direção, com o temível machado em suas mãos, quando algo inusitado aconteceu: Uma espécie de ave desceu dos céus e perfurou um dos olhos do monstro, que deixou a arma cair no asfalto, o que chamou a atenção dos moradores. Enfim, eles pareceram perceber que havia algo de errado, e todos começaram a correr.
A rua se tornou um caos! Mães pegando seus filhos fantasiados e se enfiando no meio da multidão que tentava fugir; Motoqueiros buscando suas motos e as usando para ter alguma vantagem na fuga, já que havia muita gente correndo para se usar algo grande como um carro. Até alguns policiais que ali havia tentavam atirar sem êxito no espírito mercenário, mas logo entraram em pânico e resolveram fugir com o resto dos desesperados. Em maio ao caos, uma das casas começou a pegar fogo, e o mesmo tentava se espalhar pelas demais moradias.
A ave novamente desceu até o gigante, mas agora não havia conseguido provocar nenhum ferimento. Só então percebi porque era tão difícil vê-la voar: Ela era negra. De um negro tão intenso quanto a noite, e agora vinha em nossa direção rapidamente.
—Sturk! — Gritou May, e então percebi que era verdade.
Meu coração disparou. Era como ter uma grande parte da minha vida de volta em meus braços. Há muito tempo que minha família se resumia a este fiel pássaro que agora pousara em meu braço e que eu acariciava com felicidade suficiente para acender todas as lâmpadas de Boston. O tempo parou por alguns segundos, mas então a realidade me puxou de volta quando Sturk levantou voo e, mais uma vez, tentou causar algum dano ao grande espírito materializado.
Sturk voava de um lado para o outro. O que não machucava quase nada no monstro, mas o deixava desnorteado... E cada vez mais irritado. O pássaro quase foi atingido uma vez, mas então dois outros animais apareceram correndo pela rua, também rodeando o gigante. Agora eram Sturk, Thor, e Owllie nos ajudando a ganhar tempo. De qualquer forma, ambos estavam sem seus divinos poderes.
—Precisamos sair daqui, com certeza outros materializados já sentiram nossa presença! — Sussurrei para os outros, mesmo não querendo deixar minha aura com esse horrível monstrengo.
—Precisamos encontrar Micka e os outros! — Sugeriu-me May, que parecia ter recuperado os sentidos.
Tie, de repente, pousou a mão sobre a cabeça e fechou os olhos. Parecia estar sentindo algum tipo de dor, talvez enjoo, pois teria caído se eu e May não tivéssemos sido mais rápidos. Assim que abriu os olhos, percebi o que estava havendo. Lembro-me bem dessa dupla na minha geração, e só agora havia percebido que Tie fazia parte da nova dupla de mensageiros.
—Inna está falando comigo... — Confessou, um pouco mais ofegante que a três minutos atrás. Os mensageiros não perdem seus poderes de contato no Halloween, mas sentem uma dor mais forte a cada vez que a usam. Ainda mais esses dois, completamente destreinados. — Paula está com ela e Micka com sua mãe e Isa, as cinco acabaram de ver a multidão que saiu correndo desta rua.
—Diga a elas que corram para qualquer lado, e que se separem em duplas, assim seu cheiro ficará mais fraco aos materializados.
Observei o garoto quase desmaiar mais algumas vezes, e um pequeno corte se abriu sozinho em seu braço, por onde escaparam algumas poucas gotas de sangue. Após algum tempo, ele havia voltado a si.
—Micka e Inna estão indo para a escola, enquanto Paula, Jeniffer e Isa vão voltar até a casa de uma das duas para pegarem algo que lhes sirva como armas. — Tie enfim notou o corte em seu braço, mas expliquei rapidamente o porquê de ele estar ali.
—Vamos sair daqui, estamos parados há muito tempo...
—O diário! — gritou May, assustando a mim e o outro garoto. — Alguém na multidão pegou o diário da minha mão! Eu não havia percebido... Mas... Eu preciso daquele diário! Eu tenho que... Eu preciso... AMY! — de repente a garota mudou de um estado assustado e nauseado à um completamente raivoso e decidido. —EU VOU MATAR AQUELA DESGRAÇADA!
—Não foi Amy quem roubou o diário! — afirmou outra curiosa voz. E, esta, eu reconheceria em qualquer lugar. Assim que me dei conta, a senhora já estava abraçando May, que não compreendia absolutamente nada.
—Senti tanto a sua falta... Mas... Você cresceu tanto... — Madellyne agarrava com força sua neta, e as lágrimas rolavam por suas maçãs bem definidas do rosto. — Se eu pudesse estar protegendo você todos os dias... Se eu não tivesse... Se eu...
—Vovó... — May, então, percebeu quem era aquela mulher que sentia tanto afeto por ela. Ela não conheceu aquela mulher, mas sentia quem era. — Não se culpe. A senhora conseguiu me proteger, vovó. Eu estou aqui agora, viva, saudável. Talvez um pouco atordoada e confusa com tudo, mas estou bem!
—Ah, graças a Deus... — a mulher desfez o abraço, passando mais algum tempo com as mãos no rosto da garota.
—Uma geração inteira se passou, e a velha continua me ignorando... — Brinquei, estampando um sorriso no rosto. Ver aquela senhora bem na minha frente, depois de tanto tempo, não podia me fazer deixar de pensar em sua linda filha...
—Oh, Paul, querido! — Madellyne correu para mais um abraço, e então senti um arrepio na nuca. Suas mãos continuavam macias e quentes, como as de uma avó apegada a sua família. Seu cheiro, de hortelã, continuava tão relaxante como anos atrás. Aquela ali, que me abraçava, era a mesma jovem valente e caridosa que, há tanto tempo, havia salvado minha vida tantas vezes. Só então percebi o papel de Jennifer em toda essa história. Assim como Madellyne era na minha época, a mãe de Micka havia, sutilmente, recebido o brilhante papel de protetora desta nova geração. — vejo que tem uma leve tendência a herdeiras Crommwell... — Disse, com um sorriso que me deixou completamente vermelho de vergonha. — Acalmem-se, estou apenas brincando. E você... — Disse, apontando o indicador para Tie. — É um dos mensageiros... Bom, desejo-lhe muita sorte, vai precisar...
Observei Tie gelar como um picolé de coco. Sem dúvida, o destino reservaria algo péssimo para sua vida. Afinal, todo poder gera um custo. Eu sei bem disso... Era um dos mensageiros de minha geração.
—Precisamos sair daqui! — Voltei a dizer, chamando a atenção das três figuras a minha frente.
— Sem dúvida, — Concordou a avó de May. —Eu preciso encontrar a bruxa dos aracnídeos, ela é uma das punidas que voltou sem permissão pelo portal. Por isso estou aqui, para completar esta missão. Mas, May, não desista! Amy não pode pegar o diário de forma alguma, entendeu? Ela pode ter uma aura roxa, mas seu espírito é tão negro quanto a magia de Marianne. Guarde-o com você sempre!
A mulher entregou o livro para sua neta, que implorava para que sua morta avó ficasse com ela até o fim da noite. Tempo perdido: a senhora já havia desaparecido, deixando para trás um pouco de sua fumaça rosada que logo se desfez no ar.
— Não podemos deixar Occino por aí! —Disse Tie, fazendo-me virar para olhar o gigante mais uma vez, cercado pelos quatro animais que tentavam deixa-lo tonto. — Espere... Aquele é o gato... Aquele é Burnstein!
E era verdade. O gato preto agora estava aliado às demais mascotes, correndo e saltando de um lado para o outro, atrasando e até distraindo o tal monstro mercenário. Isso só deve querer dizer que Marianne deveria estar por perto.
—VAMOS! — Gritou May, apontando para duas cabeças que, por meio de algo que parecia um buraco negro no terreno de uma das casas, saíam de baixo da terra.
Assenti para os outros dois, simbolizando que deveríamos correr. E então o fizemos. Não paramos por muitas quadras, ambas completamente vazias e gélidas, até que vimos um casal com seu filho fugindo de um materializado adulto, com muitos músculos e uma roupa esfarrapada. Tinha a cabeça raspada e muitas tatuagens. Soubemos que era um materializado apenas pela arcada dentária reluzente à luz prateada da lua, que parecia segui-lo.
Tie e May prepararam seus punhais, e eu segurei firme meu par de facas. Assoviei, sempre com cuidado para não chamar atenção demais, e observei enquanto o ser voltou o olhar verde escuro para nós e passou mudou sua rota, correndo em nossa direção. Não consegui esperar: Assim que ele estava a apenas cinco passos de nós, me joguei em cima dele, com as facas erguidas, perfurando sua testa e seu peito. Esperei que caísse sem vida no chão e peguei as facas de volta. Estas que eu limpava na minha camisa negra (e, agora, com manchas vermelhas inclusive em suas longas mangas). Pensei em ironizar um pouco, me gabando com meus dois amigos pelo meu desempenho, mas eles travavam sua própria batalha.
May, que prendera seu diário na parte de trás do cinto (após aperta-lo mais um pouco), brigava com dois dos materializados, enquanto outro, uma mulher de olhos negros e aparência de uma madame metida de Nova York, prendia Tie no chão, tentando mordê-lo. Mas, sua faca estava em sua mão, porque não atacava? Porque não... Ah, meu pai, não consigo acreditar.
Assim que percebi que o garoto não tentaria matar a mulher, cravei minhas duas facas nas costas dela, que caiu molenga em cima de Tie. Após recuperar minhas armas, chutei o corpo para a direita e ofereci a mão para que Tie se levantasse.
—Amigo, não existe cavalheirismo com essas coisas! — Disse a ele, que abaixou a cabeça, envergonhado. — Apenas tome cuidado... Lembre-se de que não se tratam de pessoas normais. Se não mata-las, elas te matam.
— SERÁ QUE OS DOIS CAVALHEIROS REAIS PODEM ME OFERECER ALGUM SUPORTE? — May gritou tão alto que até Occino deveria ter escutado. Mas isso me despertou, e a Tie também.
Ele pegou seu punhal e o cravou rapidamente no pescoço de um dos dois homens que atacava a bruxinha, que caiu morto. O outro eu tive o prazer de cuidar: Esperei que May o paralisasse com outro daqueles seus chutes certeiros e então uni a força das duas facas negras e decepei após algum tempo, enquanto ele gemia, sua cabeça.
Ambas as figuras desapareceram em fumaça negra após pouco tempo.
— Precisamos chegar a Inna agora! — Soltou Tie, parecendo um pouco tonto. Estava óbvio que havia ocorrido outra comunicação. — Ela e Micka se prenderam na loja de conveniência do posto da esquina da escola. Do lado de fora, segundo ela, alguém com uma serra elétrica.
May me encarou, pasma, e então voltou seu olhar para Tie. Agora, lágrimas escorriam pelo rosto gelado da garota.
—Paul... Precisamos ir! — Voltou a dizer, seriamente, o garoto. Seu rosto havia recebido uma forçada pincelada de preocupação extrema.
Assenti, embora soubesse dentro de mim que não teríamos tempo suficiente para chegar ao local.

(Continua...)

Lua escura - Parte 2

Abaixei o capuz para sentir a brisa que corria ao meu redor. A rua não estava movimentada, mas também não literalmente vazia. Um casal passeava alegremente pela calçada a minha esquerda, se beijando vez ou outra ou apenas sorrindo. Ouvi suas risadinhas, seus sussurros, seus passos. Era realmente assustador presenciar algo tão normal depois das últimas experiências.
Eram sorrisos sinceros aqueles. Sorrisos tão puros, capazes de domesticar até o maior assassino de todos os tempos, o que me causou um arrepio demorado.
Qualquer outra pessoa correria ou desmaiaria no momento em que o lindo casal desapareceu feito fumaça e ressurgiu, sacudindo as folhas caídas ao redor, a três metros de distância de onde se encontravam. Qualquer outra pessoa que não tenha os ensinamentos de Paul. Qualquer outra pessoa que não tenha uma aura-protetora-animal a seguindo por todo o canto.
Mas eu não era qualquer outra pessoa... E hoje não era um dia qualquer...

————————— Tie:

Observei enquanto todas as outras pessoas corriam alegres, tentando conseguir arrumar suas casas para esta noite. É incrível o modo como todos adotam o espírito deste feriado macabro, e eu não me excluo desse “todos”. É impossível não amar o Halloween.
Passei pelo pequeno e largo portão de madeira de minha casa, ignorando o gramado verde e as poucas flores que se alimentavam da luz. A porta já se encontrava aberta. Provavelmente Paul deve ter chegado de sua busca por Marianne assim que percebeu que ela não voltaria, e agora estaria entediado zapeando pelos canais de TV ou visitando o blog “Elementares” pelo meu laptop.
Joguei minha mochila em um dos bancos da cozinha e matei minha sede com um copo de água bem gelada. Gastei pouco mais de cinco segundos no cômodo até avistar Paul descendo do sótão com uma caixa enorme feita de papelão e alguns outros tipos de papel.
—O que é isso? — Perguntei, me aproximando antes de perceber que estava lacrada.
—Coisas indispensáveis para o dia das bruxas... — Respondeu, deixando a caixa em cima do balcão. — Hoje não é um dia comum, Tie. O Halloween é o dia dos espíritos.
—E daí?
—O único dia do ano em que os mortos se materializam em um corpo real e podem andar livremente por aí. — Respondeu, pegando um facão na primeira gaveta do armário para romper o lacre. — Somos procurados em ambos os mundos agora, não podemos deixar que eles se aproximem de nós. Sabe, estando “vivos”, eles tem mais facilidade em nos matar. E, acredite, os mortos ainda querem o sangue de May.
—Materializam? — Repeti, assustado. Observei-o, enfim, abrir a tal caixa e retirar de lá objetos conhecidos e alguns outros que eu não sabia exatamente explicar o que eram. — Isso quer dizer que todas as coisas que nos atacaram nos últimos dias retornarão?
—Pior que isso: — Disse, assustando-me mais ainda. — Isso quer dizer que muitos deles virão especificadamente atrás de seus corpos vazios.
—Vazios?
—estarão vazios assim que eles matarem vocês... — Me explicou, jogando-me uma abóbora roxa com uma vela inteira dentro, que eu quase deixo se espatifar no chão. — A menos que estejamos preparados.
—E o que exatamente essas... Éh... Abóboras tingidas farão para impedir?
—Nada... — Disse, sorrindo como deboche. — Mas essa casa precisa dar um susto em, pelo menos, uma criança...
Sorri por dois segundos. Pela primeira vez, Paul parecia entusiasmado com alguma coisa, e eu não seria um bom amigo se estragasse isso. Era estranho chamá-lo de amigo depois de todas as experiências que ele nos fez passar. Mas, afinal de contas, ele nos salvou. Vê-lo como um amigo era o mínimo que todos nós poderíamos fazer.
—Bem, May costuma ter coisas sobrando no Halloween, vou checar se ela pode ceder algo... — Disse, pegando uma das maçãs da fruteira de cima do balcão e dando alguns passos na direção da saída.
—Veja se ela não pode emprestar alguns esqueletos. — Sugeriu, subindo no balcão para pendurar teias falsas no teto.
Sem responder, passei pelo largo portão branco e caminhei até a rua vizinha, onde moravam May e, até pouco, Heath. As calçadas também estavam sendo decoradas este ano, com túmulos falsos e zumbis de cera, o que me desconfortou seriamente. Assim que passei pela última horda de mortos-vivos reparei que a rua mais parecia um cemitério, e que as pessoas, estranhamente, estavam felizes com isso.
Antes mesmo de me dar conta, estava a apenas alguns passos de distância da casa de May, e agora eu avistava mais alguns zumbis de ceras e muitas múmias de papel higiênico. O céu ameaçava chuva e, curiosamente, esta rua estava completamente vazia.
Mesmo evitando pensar muito, não pude deixar de sentir a presença de minha coruja em algum lugar próximo. Claro que ela não me obedeceu quando eu a mandei me esperar em casa com Paul. Apesar de aparentar ser apenas uma ave, ela era uma aura bem insistente.
Assim que o assunto me fugiu a cabeça, avistei o animal sair voando apressado da casa de minha amiga. Logo depois, uma espécie de raposa saltou para fora do terreno, se transformando em uma aura de cor roxa e seguindo minha ave.
—May? — Corri os últimos dez passos até a casa da jovem, e me assustei ao ver outra garota sendo envolvida por uma espécie de fumaça de mesma cor que a verdadeira forma da raposa. — May? O que é isso?
—Tie, tire Thor daqui! — Me gritou, sem olhar diretamente para mim.
Sem pensar, assenti. Corri até a metade do gramado e agarrei o cachorro, que saltou de meus braços e atravessou a rua correndo atrás dos outros dois animais. A velocidade daquele cão era incrível, tecnicamente impossível.
—May! — Gritei assim que a outra garota fez chamas crescerem ao meu redor.
—Deixe-o! — Ordenou com um grito enquanto a chama se extinguia aos poucos. — Não meta meus amigos em assuntos familiares, sua vadia!
—Dê-me o maldito diário agora, ou este jovem pode ter uma longa falta de ar!
Tive um rápido arrepio, seguido de um intenso frio na barriga. Se eu entendi bem, essa bruxa acabara de me incluir em uma “guerra” de família ameaçando provocar a minha morte. Minha cabeça foi capaz de raciocinar pelo menos isso, e também que o que eu viria a fazer a seguir seria muito perigoso sem minha coruja por perto. Mesmo assim, eu o fiz.
Antes mesmo de May responder a ameaça de sua colega, corri até ela e agarrei o diário de couro preto antes de puxar sua mão e sair correndo pela calçada. Ouvi um grito de fúria desumano atrás de nós, mas não desacelerei o passo ou ousei olhar para trás, continuei correndo com May e o diário Crommwell.
—Tie, o que está fazendo? — Perguntou, ainda correndo.
Ignorei a pergunta e entrei na rua seguinte sem prestar muito atenção nos vizinhos que nos encaravam como se fossemos loucos. Bem, provavelmente somos loucos. Passamos por mais algumas casas grandes que, por sinal, estavam decoradas perfeitamente, e entramos em minha casa, chamando atenção de Paul, que enchia uma grande panela de barro com água e gelo seco. Mas, assim que viu nossas caras e o jeito como eu segurava o diário, sua expressão mudou completamente.
—O que... O que houve? — Perguntou após abandonar a panela e se aproximar de nós dois.
—Amy Crommwell! — Respondeu May, ofegante. — Ela veio buscar o diário... E agora quer matar a mim e a Tie.
—fiquem aqui dentro até escurecer, entendido?
—Por que até o escurecer?
—Há muito tempo uma maldição foi feita... — Começou Paul. — Uma maldição que bloqueava o poder de toda e qualquer bruxa temporariamente. Na noite de Halloween, ninguém tem poderes. Bruxas, encarnados, absolutamente ninguém!
—Não falta muito para que a lua chegue... — Lembrei. — Podemos aguardar aqui um pouco, antes que tudo piore. Mas... E os outros? E minha coruja? Micka não sabe que...
—Não se preocupem. Na verdade, só nos resta esperar no fim das contas...
Os pelos dos meus braços se arrepiaram, e notei que May sentia exatamente o mesmo quando vi sua expressão. Entrelinhas, Paul não estava necessariamente falando sobre a maldição do Halloween. Não, ele estava falando sobre outra maldição. A guerra em que a descendente Crommwell estaria destinada a largar sua vida, literalmente. Pela primeira vez, eu realmente percebi que Paul não queria a morte de May. Ele a queria aqui, conosco.
A pergunta agora era: seria possível que um jovem encarnado teimoso mudasse tão rápido de opinião em relação a adolescentes que tentou matar várias vezes? Ou será que ainda existe um plano por trás de tudo isso? Afinal, onde está Marianne neste exato momento? E Celly? Onde se encaixa o desaparecimento dela?
Quebrei minha linha de raciocínio assim que comecei a imaginar coisas absurdas e assustadoras. O pior foi pensar que a maioria das minhas hipóteses poderia se tornar realidade algum dia. Tentei, por um segundo, esquecer o assunto.
Paul continuou decorando a casa conforme a lua subia ao céu, enquanto eu observava May escrevendo alguma coisa no diário de sua avó. Sentei-me ao lado dela e observei o que ela registrava:
“31 de Outubro – O nascer da nova geração.
Afinal, isso não pode terminar assim. Essa guerra, tudo está errado! Precisamos arrumar um jeito de impedir isto, precisamos impedir a minha e outras centenas de mortes que isto provocará.
Não fosse o bastante o fato de que querem me matar, agora me aparece uma suposta parenta distante, também bruxa (e muito mais evoluída que eu), que quer por que quer o diário Crommwell, e chegou a quase matar Thor por ele.
Essa não... Quase me esqueci de Thor! Ele correu atrás da aura de Amy (Que por sinal, é um animal extinto) assim que a raposa começou a seguir Owllie pela noite escura de Halloween. Onde estarão eles agora?”.
A moça parou de digitar assim que Paul nos chamou a atenção, jogando para nós dois punhais, um prateado e com a figura de um lobo no centro, e outro de lâmina dourada e com o desenho de uma lua minguante gravada no meio. Mesmo sentindo um pouco de ânsia ao ver a lua, observei enquanto May a segurava e a prendia em seu cinto negro depois de se levantar.
— O que quer que façamos com isso? — Perguntei, depois de pegar a lâmina prateada largada ao meu lado.
—Se defendam! — Respondeu, prendendo um par de facas completamente negras no cinto, assim como May fez. Vendo isto, e tomando nota que parecia ser um ritual para os outros dois na sala, ele fez o mesmo. — A lua está no alto... A noite dos mortos começou!

Se Paul não tivesse nos dito como era perigoso para nós ficar parados em um lugar só em uma noite como esta, May e eu nunca o teríamos seguido por seu passeio pela vizinhança. Nossas armas estavam preparadas para qualquer coisa, apesar de que rezávamos para que não precisássemos mesmo usá-las.
As ruas estavam aterrorizantes: Calçadas repletas de múmias, lobisomens, zumbis, aranhas gigantes, túmulos, sangue falso, uma espécie de gosma verde-fluorescente, e muitas outras coisas... Inclusive pequenas figuras fantasiadas, as crianças. Muitas casas mal-assombradas para uma noite só. Apenas os três pareciam realmente ter medo do que poderia ter dentro daquelas moradias. Aliás, éramos os únicos “fantasiados” de caçadores de bruxas, com nossas “facas” benzidas e as vestes pretas. Apesar das lâminas, ninguém pareceu realmente ligar.
E então, como um vulto, algo agarrou um dos braços de May mais rápido do que uma cobra ataca sua presa. Paul e eu nos viramos no mesmo instante, erguendo os punhais. Mas May foi mais rápida: Mesmo tendo sido impedida de chegar à sua lâmina, a garota deu um chute em um lugar não muito bom assim que se certificou ser um homem. Esse que, agora, gemia de dor e angústia. Permaneceu assim por mais ou menos uns dois minutos completos, e apenas quando se ergueu mais uma vez o trio pode ver de quem se tratava.
—Heath? — Dissemos eu e May, em uníssono, enquanto o jovem abria um sorriso maldoso.
—Vim para ter meu acerto de contas... — Sussurrou, com uma voz um pouco rouca, antes de mostrar assustadores dentes que lembravam uma arcada dentária de um tubarão branco e se jogar em cima de Paul.

(Continua...)

Lua Escura - Parte 1

O Sol começava a se erguer no céu.
A manhã alaranjada vinha acompanhada de uma leve e doce onda de ar que avançava lentamente sobre a população da linda Boston. No alto, onde o céu não dava espaço a nuvens, pássaros voavam livremente, compartilhando seus cantos e suas cores vivas que pareciam concordar com o tom da luz natural.
Olhei atentamente para um jovem casal de esquilos que se esconderam atrás de uma moita assim que eu me aproximei. Não consegui conter o sorriso, e nem quis. Era muito bom poder sorrir novamente. Descansar. Poder pensar um pouco como alguém normal, em uma rotina normal, em seu mundo completamente normal.
Infelizmente... Sei que isso não vai durar muito.

——————— MAY:

A rua estava vazia devido ao horário. Estava muito cedo. Eu caminhava alegremente enquanto meu i-pod reproduzia “When i look at you” da Miley Cyrus. Estava um dia realmente perfeito para mim.
Finalmente cheguei ao meu destino.
Passei pelos gigantescos portões centrais da escola, cumprimentado os muitos alunos que já haviam chegado e agora se distribuíam em seus pequenos bandos. Era ruim ter de falar com todos, mas eu queria realmente fazê-lo. Queria, mais uma vez, brincar de ser importante em meio à sociedade.
Passei direto pelo pátio central, subindo pela escada de meio-pátio e chegando a uma área do segundo andar onde o caminho oferecia três opções. Três corredores distintos: Um repleto de armários com banheiros ao final; Outro onde foram construídos quatro enormes laboratórios de química; E outro que resultava em pequenas salas de aula de línguas estrangeiras diferentes.
Dei uma olhada para além da escada, para o pátio por onde eu havia acabado de passar. Lá estavam Paul e Tie. Tie tentava ser o GPS do garoto loiro até que ele se acostumasse de verdade com o local. Parecia estar fazendo um belo trabalho, pois Paul possuiu uma expressão ansiosa assim que seu amigo apontou para a sala de aula teatral.
Voltei minha atenção para o corredor dos laboratórios. Eu estava realmente doida para conseguir uma daquelas questões quase impossíveis de equilíbrio molecular. Por sorte, essa seria minha primeira aula.
—Pensei que vocês tivessem saído da cidade...— Disse uma voz, quebrando minha atenção. Levei um tempo para me recompor do susto depois que olhei para o lado e vi que não passava de um garoto otário predestinado a não ter futuro nenhum.
—Pensei ter dito a você para não se aproximar de mim ou de meus amigos! – Respondi rapidamente, lançando-lhe um olhar de fogo e culpando a genética por não ter me criado caninos pontudos e garras afiadas.
—Sou o tipo de cara que não sege regras...
—Mesmo? Então, adivinha só: Ontem eu passei no cartório e mudei meu nome para “Regras”! — Sorri sarcasticamente. — Ou seja, já pode me deixar em paz e ir procurar algo para fazer!
—Talvez eu deva mesmo! — Disse, recuando dois passos sem desviar os olhos de mim. — Quem sabe eu e Micka não tenhamos uma conversinha? Ela não me satisfez da última vez. Está me devendo muita...
—Fique longe dela! — Meu tom de voz mudou de impaciente para raivoso. Talvez eu estivesse mesmo exagerando, mas Micka merecia um pouco de descanso antes de receber de volta seus antigos problemas. — Estou avisando, Andrew, se você ousar permanecer no mesmo pátio que ela, eu...
—Você o que? – Perguntou, abrindo os braços, sem abandonar o sorriso. — Você me tortura até a morte? Ou, não, você chama seu novo amiguinho para me torturar... Ai... Já consigo sentir a dor e o sangue me abandonando...
—Algum problema? — Não consegui evitar levar mais outro susto quando uma terceira voz foi auto-adicionada a conversa.
Drew então cruzou os braços, desfazendo o sorriso e voltando seu olhar para o outro garoto, analisando-o de cima a baixo. Às vezes eu me esqueço de que Paul consegue escutar mais do que um humano deveria...
—Não... — Respondeu o ex-namorado de Mickaella, mesmo que a pergunta não tenha sido direcionada a ele. — E, mesmo que estivéssemos com algum, não precisaríamos do seu intrometimento.
—Paul, deixe-o. Não vale a pena... — Disse, puxando o braço do rapaz loiro e o carregando para longe. Demorou um pouco, pois ele era forte demais, mas consegui. Só então percebi o quanto é difícil ter um amigo encarnado, ainda mais quando esse quer se meter em brigas. Em minhas brigas.
Deixamos Andrew resmungando algo à beira da escada, e entramos no corredor dos laboratórios de química, entrando no de número três e sentando na segunda mesa tripla da quarta fileira. Por um instante, voltei a me lembrar do meu último dia na escola antes do caos. Bem no dia em que Micka e Tie foram esperar Isabella no aeroporto. O mesmo dia em que o Sol havia brilhado para nós mais uma vez. O que me assustou outra vez, pois o Sol brilhava hoje mais uma vez.
—Hey, agora vai roubar o meu lugar também? — Disse Tie, sorrindo, enquanto jogava sua mochila no chão e se sentava na última cadeira vaga da mesa. — O que houve? Eu virei por um minuto para pegar a chave de seu armário e você desapareceu.
—Sim, resolvi fazer novas amizades. O povo daqui é bem... Confiante.
—Andrew?
—Sim! — Respondi, antes que Paul soltasse mais um deboche sobre a população de Boston. — Pelo visto as coisas não mudaram por aqui... Nem um pouco.
—É claro. — Opinou Tie. — Não se esqueça de que todo esse sinistro “combate” só aconteceu para nós. Ninguém sabe de nada May, eles não perderam a proteção, lembra? Ninguém daqui consegue ver absolutamente nada do que conseguimos.
Parei para refletir por um segundo.
Parecia loucura, mas era verdade. Tudo pelo qual passamos foi uma história quase que particular. Era-se capaz de ousar pensar até que tudo foi fruto de nossa imaginação. Não fossem as marcas que nunca nos deixariam, poderíamos nos considerar legítimos loucos.
Abaixei a cabeça por um segundo e a balancei, em negativa, enquanto ouvia fragmentos da conversa dos dois garotos ao meu lado. Passou mais um segundo e eu olhei para a outra fileira de mesas, onde todas estavam lotadas de livros esquecidos e reações feitas pela metade. Por um momento pensei em terminá-las, mas então percebi que não me lembrava de absolutamente nada condizente a matéria.
—E o que acontece agora que a lua minguante se foi? — Perguntou Tie, capturando de volta minha atenção.
—Ainda estamos sujeitos a ataques, embora as criaturas tenham muito menos força durante outras fases da lua. — Respondi.
O diário de minha avó foi o suficiente para que eu encontrasse a resposta de tal pergunta. Eram incríveis as descobertas feitas por ela em tão pouco tempo de magia. Porém... Sinto que ainda á algo de errado naqueles registros.

Sete horas haviam se passado. O caminho de volta parecia-me tão tranqüilo quanto o de ida. Em alguns minutos eu estava em meu quarto junto a Thor, que dormia debaixo de minha cama.
Agora eu estava com o diário de Madelynne aberto em meu colo, enquanto eu lia uma das páginas do meio. Nela, haviam descritos dois feitiços de ataque: Um deles servia para distrair, e fazia com que uma terrível tempestade se iniciasse no momento em que o feitiço fosse conjurado; e o outro fazia apenas com que qualquer líquido próximo ao bruxo atacante congelasse instantaneamente. Em meu ponto de vista, feitiços inúteis.
Virei à página.
Essa era uma das páginas que eu já havia lido. Mesmo assim, foquei meus olhos nas últimas palavras, ainda sentindo um calafrio ao fazê-lo:
“Quem conseguir ler isto, obviamente é um Crommwell legítimo! Provavelmente este é o fim para mim... Mas você,seja quem for,caro amigo,ainda pode se salvar! Ainda DEVE se salvar... Se esconda, eles te seguirão, e você deve estar preparado (a)! Boa sorte...
Madelynne R. Crommwell – A bruxa das flores.”
Passei, fria, para a próxima página. Vazia.
Avancei mais duas. Nada.
Estava claro... Aquele foi o último registro de minha avó. Ela não teve tempo de ensinar mais aos futuros Crommwell’s... Não teve tempo de tentar nos preparar para as guerras... Ela foi pega. Foi morta. Mal teve a chance de chegar à guerra do eclipse e tentar manter sua honra.
Mas agora possuo meus próprios problemas... Não posso deixar me abalar por algo do passado. Não agora, justo agora, que todos dependem tanto de mim. De minha mágica inexplorada e, até pouco tempo, inexistente.
Não... Eu preciso ser forte! Preciso de mais...
—Preciso praticar! — Disse, em voz alta, enquanto fechava o diário e caminhava decidida em direção ao jardim.
Desci as escadas e passei pelas portas até chegar ao local desejado, onde eu me assustei ao ver um animal um pouco maior que um cachorro me encarar do canto de margaridas.
—O que é... — Cancelei minha fala assim que reconheci a espécie. Deixei o diário cair, aturdida, e senti minhas sobrancelhas se curvaram involuntariamente. Minha boca congelou, aberta. Fiquei definitivamente paralisada. Se eu não estivesse realmente doida, o que eu estava vendo bem na minha frente era uma...
— Uma legítima Raposa-das-falkland. —Disse uma voz atrás de mim, que me fez pular de susto antes de me virar para trás. — Ou, se preferir chamar assim, Lobo-das-malvinas.
Enfim consegui encontrar o ser que falava comigo. Era uma garota, aparentava ter minha idade e era um pouco mais alta do que eu. Seu cabelo, liso e preto com mechas e pontas azul-escuro, estava preso em um rabo de cavalo, e caía até sua cintura. Ela vestia um conjunto gótico completamente preto: Uma blusa de mangas longas com a estampa de um crânio roxo no centro e uma saia que ia até os joelhos, um par de all-star preto, meia-calça preta e pulseiras pontiagudas roxas e prateadas. Por um momento, lembrei-me de Inna, era impossível não lembrar. Seus olhos eram verdes com rabiscos finos e pretos ao redor, e suas unhas também eram pintadas de pretas.
Peguei o diário do chão e o abracei forte assim que percebi para onde ela direcionava o olhar. Isto a fez sorrir maliciosamente. Após alguns instantes de silêncio, percebi que Thor havia me seguido e rosnava para a raposa. Tentei ignorar, voltando minha atenção para a garota.
— Raposas-de-falkland foram extintas no século XIX. —Soltei, assim que percebi que não sabia o que dizer. Mais uma vez, ela apenas sorriu.
—Me chamo Amy... — Disse, mordendo os lábios. — Amy Crommwell. Feliz em me conhecer, priminha?
Perdi a respiração por dois segundos. Não consegui fechar os olhos, minha pele gelou, minhas mãos enfraqueceram, mas não o suficiente para que eu largasse o livro de minha avó. Enfim, consegui recuperar meus sentidos, embora eu ainda estivesse completamente assustada. Quer dizer, existem outros Crommwell’s? Eu não sou a única?
—Ouvi dizer que está com o diário de minha avó... — Disse ela, estendendo a mão direita. — Ficarei feliz quando me devolver.
—Devolver? —Perguntei, rangendo os dentes. Por algum motivo, eu não conseguia controlar minha raiva com a presença dela. — Eu não preciso te devolver nada! Este diário nunca foi seu, foi de minha avó! Por que eu te devolveria?
—Porque se você não o fizer por bem, eu vou ter que pegá-lo a força! Apenas um legítimo bruxo-Crommwell deve possuir este livro.
—Qual parte da “minha avó” você não entendeu? — Respondi, sentindo o calor subir ao meu redor. — E você? Seu nome nem sequer aparece em alguma página. Em todas as páginas, Madelynne deixa bem claro que o propósito de sua vida era salvar a mim e a minha mãe. Então, se você acha que eu não sou uma herdeira do poder, saiba que você nem sequer existia para ela! — Senti mesmo que fui rude demais. Porém, foi ela quem começou a provocar.
A garota sorriu mais uma vez, com os braços cruzados. O que me fez ir a loucura.
—Então é você mesmo... — Disse ela, enquanto me olhava dos pés a cabeça. — A legítima filha de Cloe... Aquela que foi escolhida pela “guerra do eclipse”.
—Como... Como você sabe sobre isso?
—Quando se é uma das ultimas duas pessoas de uma linhagem inteira de bruxos, você precisa saber do que se esconder...
—O que você quer comigo, então? — Perguntei. Não queria me deixar levar apenas pelo fato de ela ser meu único parente viva no mundo inteiro. Ela não era como eu.
—O diário! — Respondeu, batendo um dos pés no chão, o que fez a raposa saltar, com os dentes a mostra, no pescoço de meu cachorro.
—VADIA! — Sem saber como, ao olhar para o animal atacante, fiz com que o mesmo fosse arremessado para longe, batendo e quebrando a cerca de madeira que ficava em volta do terreno. Voltei a encarar a garota, que agora era envolta por uma espécie de fumaça roxa.
—Agora vamos jogar do meu jeito!

(Continua...)

A última nuvem (Última parte)

- A última nuvem ( 3 de 3 - último episódio da primeira temporada)


-prenda-a no chão! – Gritou o homem, estalando os dedos de uma das mãos.
Nada aconteceu...
-Sairrus está lutando! – Lembrou Paul, apontando para a grande sala dos móveis que agora tinha boa parte de sua parede caída ao chão.
A cena não estava nada boa: O morcego levantava vôo rapidamente, e a aura tentava acompanhar seus movimentos, atacando vez ou outra. Agora a criatura havia feito um rombo enorme no teto, e repetiu o ato no segundo andar. Assim, a aura e o demônio saíram se chocando noite afora.
Noite... Havia estado preso tanto tempo na jaula de elefante que Paul mal percebeu que o tempo não havia, de fato, parado.
Por trás da batalha aérea, o rapaz loiro conseguiu a ver novamente: A lua minguante.
-SAIRRUS! – Gritou, correndo para fora da velha casa.
-Volte aqui! – Disse a garota, suas palavras saindo mais parecidas com sussurros altos do que com palavras.
Ela ameaçou ir atrás do homem de aura branca, mas Paul agarrou seu braço no último instante. Girando-a no ar e a arremessando na direção da escada. Isso poderia ter matado uma pessoa comum, Mas Paula não era uma mortal.
A jovem teria conseguido se reerguer, se Paul não tivesse lhe arremessado algumas pedras caídas da construção, que atingiram em diversos lugares. Enfim, a jovem, ensangüentada de um sangue aguado, caiu inconsciente no chão.
-Isso deve me dar algum tempo... – Ao olhar para trás, viu que o homem continuava correndo para longe, acompanhando a batalha acima de si. – Hey, espere por mim!
* * *
-Não adianta! – Inna agora gritava furiosamente, rangendo os dentes e cerrando os punhos. – Não conseguimos nem rabiscar a maldita porta de pedra!
-Temos que continuar tentando! – Alguém respondeu, mas a garota esta com raiva suficiente para não procurar saber quem era.
-Não! – Inna parecia não mais gritar, mas sim rosnar agora. – Paul é o único que tem chances de conseguir abrir passagem. Temos que ir atrás dele!
* * *
A aranha parecia crescer uns dez centímetros mais a cada segundo que se passava, mas isso provavelmente era uma peça pregada pelo pavor de ambos os dois jovens e os dois animais desmaiados no outro canto do grande salão.
Tie sentiu que, brevemente, suas pernas falhariam e ele cairia no chão pouco antes de ser devorado por um aracnídeo espiritual gigante.
Assim que sentiu o tremor que as patas grossas e peludas do animal causavam na estrutura antiga, suas últimas semanas passaram como um filme em sua cabeça. E então seus olhos começaram a enxergar, seus ouvidos começaram a ouvir...
Era como voltar no tempo...

“-Encarnados? – Micka curvara as sobrancelhas. – O que são Encarnados?
- Como eu disse, não sei. Mas, segundo a breve descrição de Madelynne, são seres com aura fria.
-Madelynne? – Tie enfatizou, era mesmo para ser uma pergunta.
-Alguma ancestral minha... Ela se chamava de “a bruxa das flores”, e era perseguida pela igreja, pelos Encarnados, e pelas sombras.”

“-Não! – Ele gritou, com uma voz séria e bizarra. – Eu era seu amigo, Tie. Mas a verdade é que você apenas me usou! Me usou para se aproximar de Mickaella!
-O que? – Tie não era o único que parecia confuso ali, mas apenas ele expressava. – Ficou louco? Eu e Micka nos conhecemos desde os seis anos de idade. É minha melhor amiga... Não preciso de ninguém para me aproximar dela, e eu não quero! Já somos próximos o suficiente!
-Não vou deixar que a roube de mim! – Riley bufava, seus olhos eram inexpressivos, e algumas veias eram visíveis em seus braços.
Ele realmente estava com raiva... Mas por quê? Transtorno bipolar?
Riley fechara o punho, e o avançava rapidamente em direção a Tie, mirando em seu rosto.”

“-Corre! – Inna sussurrou.
Tie a seguiu, dando meia volta e correndo na direção oposta a da mulher. Até serem impedidos por uma outra pessoa. Um rapaz loiro de cabelos cacheados e um corvo, o mesmo corvo que atacara os dois jovens há alguns instantes atrás.
O corvo imitava a situação do gato: Seu corpo estava se desfazendo! Algumas penas pretas flutuavam e rodopiavam ao seu redor, algumas simplesmente desapareceram. E, mais uma vez, o animal havia dado lugar a uma assustadora sombra.
-Inna... – Tie sussurrou em seu ouvido. – Não importa o que aconteça, corra! Corra como nunca correu em toda a sua vida! Enquanto fazem ‘eu sei lá o quê’ comigo você pode escapar.
-Qual é? – Inna riu mesmo nervosa. – Vai dar uma de corajoso bem agora?”

“-Também estou feliz em te ver, Isa... – Micka manteve o sorriso forçado por mais algum tempo. – Fiquei super feliz quando recebi a notícia de que viria para cá.
- Já imaginava... Você me ama, prima, não vive sem mim! – Isabella ri por um segundo.
-Modesta como sempre... – Tie não demonstrava nenhuma ponta de brincadeira em sua fala. Sua expressão séria era o que comprovava isto.
-Nossa, Mickaella, Não sabia que criava sua própria maritaca. – A jovem voltou a carregar a mala com rodas, e correu para o táxi que os aguardava antes que Tie pudesse ter a oportunidade de revidar. - Quem chegar por último é um Tie! – Ela implicou, enquanto iniciava sua própria corrida.
-Mais uma vez... Como conseguiu me forçar a vir? – Tie balançou a cabeça, em negativa, e seguiu para o táxi.”

Ele passou por tanta coisa. Todos passaram por tanta coisa. Eles não mereciam isso, Isa não merecia isso, May não merecia nada disso!
Por um momento, ele pensou em culpar Deus por tudo isso,Afinal, ele poderia ter impedido a criação desse maldito ritual, mas ele achou injusto. Quer dizer, se não fosse por Deus, será mesmo que eles teriam chegado tão longe? Eles estariam ali agora se não tivessem recebido uma ajuda divina?
Lágrimas se formaram em seus olhos e, pela primeira vez em muito tempo, ele as deixou cair. Tie gostou de sentir o líquido claro e puro escorrer por seu rosto, até se soltar e o abandonar.
Ele olhou mais uma vez para Mickaella, que chorava, agachada, no canto oposto ao que ele havia sido encurralado. Seus olhos se viraram mais uma vez, até encontrar a pequena coruja caída ao lado de Burnstein, também desmaiado.
Eram tão pequenos... E, no entanto, eles haviam salvo ele e seus amigos muitas vezes durante os últimos dias. Era como se uma pequena criatura como aquela portasse o dobro da força de todo o grupo junto. E velos no chão, assim, isso apenas intensificava a dor de Tie.
E Celly...
Talvez eles se encontrassem lá em cima, ou talvez ele vá para algum outro lugar. De certa forma, ele apenas fingia ter aceitado a morte. A verdade era que ele passava os olhos por todos os lugares em busca de alguma escapatória, mas não encontrava nada.
* * *
-Volte para cá, Sairrus! – O homem gritava enquanto corria, com Paul logo na sua frente.
-Não o chame! – Ordenou o garoto loiro. – É uma aura branca, tem muitas chances de vencer!
-E muitas de perder também! Eu não quero perder minha aura!
-Auras não morrem, ok? Elas podem ficar hibernando por algum tempo, para recuperar suas energias, mas sempre voltam! Elas... Sempre...
Era impossível falar de auras e monstros sem se lembrar pelo menos um pouco de Sturk, sua aura em forma de corvo que havia sido “destruída” por esse demônio.
Algo interrompeu o pensamento de Paul. Um grande buraco negro com raios sendo expelidos para todos os cantos.
-Agora assim! – Gritou o garoto, parecendo muito assustado. – Chame Sairrus ou ele será sugado! ANDE LOGO!
-Sugado?
-Sim, o grande morcego abriu um portal de volta para o seu lar!
-De volta... – O homem misterioso arregalou os olhos e olhou para a batalha acima. As duas criaturas voavam em direção ao buraco negro. – SAIRRUS, VOLTE AQUI AGORA! ESQUEÇA ESSE MONSTRO E VOLTE PARA CÁ!
Demorou um pouco para que a aura escutasse, mas enfim o globo branco parou a dois metros do portal e então percebeu em que se meteria caso não parasse.
Todos observaram a fuga do morcego. Assim que passou pelo buraco negro, outro grande raio atravessou o cenário, atingindo uma pequena cabana abandonada. E então, em uma fração de segundos, tudo desapareceu: O demônio, o buraco negro, os raios. Parecia apenas mais uma noite normal nos limites de Boston.
A aura desceu até o solo, transformando-se em um tigre branco mais uma vez e deitando ao lado de seu dono. Observou Paul por um segundo, como se fosse um agradecimento, e então, rapidamente, adormeceu.
* * *
- O que... – Paula levantou-se lentamente, com muita dor de cabeça e alguns arranhões profundos. – Onde todos foram? – Seus olhos notaram o estado da mansão. Estava bem diferente de como se lembrava. Bem, na verdade nem tanto, mas a sala dos móveis estava completamente destruída. – Paul? Mic...
Sua mente, enfim, voltou a funcionar corretamente. Ela precisava deter o morcego, mas o monstro já não estava mais ali, e então outro fato lhe atingiu, em fragmentos: Mickaella, prisão, Tie, aranha, jaula, pedra.
-MICKA! – Gritou, e então correu como nunca na vida, passando rapidamente pela passagem secreta ao lado da escada e chegando a um túnel de pedra com algumas lanternas acima de sua cabeça. Logo avistou os demais do grupo que tentavam quebrar a porta de pedra para que os jovens aprisionados pudessem sair de lá.
-SAIAM DA FRENTE! – Gritou, com seu coração acelerado. – ISSO JÁ FOI LONGE DEMAIS!
Seu primeiro soco causou algumas rachaduras e provocou a queda de pequenos pedaços de pedra. Seu segundo abriu uma pequena parte da porta. Não havia como alguém passar por ali, mas Paula pode ver a aranha se aproximando lentamente de Tie, com Micka agachada do outro lado. Seu terceiro soco foi certeiro: Bem no meio, o que fez com que a pedra inteira se partisse em mil pedacinhos.
Sem perder tempo, Paula entrou no grande salão antigo e correu para a cena que precisava impedir que acontecesse.
Em apenas alguns segundos, o que surpreendeu a todos, a jovem moça correu e fincou as unhas em um dos olhos da aranha, que recuou, fazendo um som que lembrava o grito de um porco.
Sem perder tempo, Paula correu outra vez, parando a apenas um centímetro da aranha. Estendeu as duas mãos e, com apenas um pouco de força a mais, arrancou uma das patas do monstro, deixando uma abertura horrível por onde vazou um líquido esverdeado e algo que parecia uma daquelas geléias de brinquedo. Outra vez, o aracnídeo gigante gritou.
-Paula? – Só agora Tie havia percebido que ainda estava vivo.
-MALDITA, NÃO MECHA COM MEUS AMIGOS! – E, com um último salto, essa parou na cabeça da aranha, onde socou com toda sua ira. Sua mão atravessou o animal, saindo do outro lado com líquido verde entre seus dedos e partes de algo que parecia um cérebro grudado ao longo de seu braço.
Com mais um som agonizante, o grande e aterrorizante monstro caiu no chão, seus olhos espumando, se desintegrando aos poucos. Quando desapareceu por completo, uma grande nuvem negra surgiu no lugar e se desfez com o vento.
Aquela aranha não era um monstro... Era a aura da dama das aranhas. Melhor dizendo, era a sombra dela. Deve ter se sentido mal por não ter conseguido salvar sua dona a tempo e se transformou nesse monstro. De qualquer forma, agora estava tudo acabado.
-MÃE! – Com uma terrível tremedeira, Micka se levantou e correu para os braços assustados da mãe, que chorou ao ver que a sua filha estava viva.
-Filha... Como é bom... Ver você...

-Está tudo bem por aqui? – Paul passou pela porta caída e ficou feliz ao ver que todos estavam bem. Por algum motivo, ele havia “esquecido” sua verdadeira missão. Ele queria realmente que todos estivessem bem, e não só por causa do ritual.
-Agora está! – Inna escondia sua raiva, como sempre, tentando parecer durona. – Paula chegou bem a tempo e salvou o dia.
-Isso é bom... – Seus olhos vasculharam cada centímetro do salão, até encontrar... – Tie, a sua coruja está desmaiada!
-Sim, ele e Burn... – Os pelos do braço do garoto se arrepiaram. O gato não estava mais ali, só havia a sua ave e alguns pedaços da construção que haviam se desprendido. – O que? O felino estava aqui! Eu tenho certeza!
-Relaxe, Com certeza aquele gato safado deve ter voltado para casa.
-Estão todos bem? – May tentou falar o mais alto que pode, mas sua voz, devido ao nervosismo, falhou varias vezes.
-Creio que sim... – Agora era Riley quem falava. E, pela primeira vez e muito tempo, todos perceberam que ele ainda existia. – No entanto, onde está Marianne?
-E Corbin! – Lembrou-se Jennifer.
-Eles devem estar bem. – respondeu Paul, coçando a cabeça. – Bem, vamos sair daqui...
-Vamos para casa! – Inna bufou. Isso significava que ela estava bem, mas realmente parecia uma ótima idéia.
-Vamos nessa... – Paula desceu do animal, ofegante e com um tom avermelhado nos olhos, e limpou seu braço em sua roupa.
-Muito obrigado! – Tie a abraçou com força. Ele mal podia acreditar que, dentre tantos amigos ali, era Paula quem o havia livrado da morte certa. Mas então se lembrou de algo. – Hey... – E então se soltou dos braços da garota.
O garoto correu para o canto esquerdo próximo a saída e pegou sua coruja no colo.
-Você vai ficar bem... Paul...
-Vai ficar bem sim. – O rapaz sorriu, e então encarou Micka por dois segundos antes de finalmente falar: - Vamos embora!


3 dias depois...

Olá, Como você está? Quanto tempo eu na venho aqui...
Eu posso dizer que estou bem melhor agora, todos estamos. Por sorte, a cidade não foi muito destruída. Parece até que nunca saímos realmente de Boston.
Assim que saímos da maldita mansão e o carro resolveu voltar à vida, Paul resolveu nos levar a uma emergência para que nos fizessem curativos. Ficaram horrorizados não com a gravidade dos machucados, pois não eram tão intensos assim, mas o que realmente lhes chamou a atenção foi a quantidade.
Isa, a prima de Micka, mandou uma carta para os pais dizendo que estava tudo bem, apesar de todo o ocorrido. Na carta ela contava dos machucados, mas inventou uma história maluca onde todos nós tentávamos andar de Jet Sky com rodinhas no meio de um mar de pedras. Com sorte, eles disseram acreditaram em tudo na carta-resposta.
Bem, tentamos voltar a vida normal (ou chegar bem próximo dela) . Amanha retornaremos a escola e Jennifer voltará a seu trabalho normal. Prometemos uns aos outros que vamos ficar sempre de olho aberto. Hoje mesmo eu fui caminhando até o veterinário para que ele tirasse todas as pulgas que Thor pegou no meio daquele matagal de beira de estrada.
O estranho é que ninguém sabe onde Marianne, Corbin e aquele estranho homem e seu tigre branco se meteram. Paul está em estadia na casa de Tie e conseguimos convencê-lo a ir para a escola conosco. Celly também não deu mais as caras por aqui, e nem mandou sinal algum. Nem mesmo Inna tem sonhado com ela.
Riley foi o único que resolveu partir. Aproveitou que seus pais estavam se mudando para Vancouver e resolveu ir com eles. O estranho é que ele não se despediu de Micka, apenas mandou um bilhete onde se lia “Prefiro acabar com tudo.” . E, mais estranho ainda, a garota ficou feliz por isso.
A notícia boa é que eu prometi a mim mesma que aproveitaria cada momento com meus amigos, já que não sei o que o destino guarda para mim. Se esse ritual todo estiver certo, eu morrerei na guerra do Eclipse. E eu não sei quando isso vai acontecer, então preciso me divertir o máximo possível!
Mas, uma coisa ainda me atormenta...
Tie me contou de suas visões... As visões que teve enquanto a mulher louca das aranhas o prendeu em outra realidade. Ele viu Paul tentando ajudar minha mãe, e viu que estavam vindo atrás de mim e de minha avó... Mas...
Eu estou viva... E no diário consta apenas a morte de minha avó. Será possível que...
Ah, quer saber, depois eu penso nisso. Agora eu preciso ir, Inna me chamou para ir ver algum filme no cinema. Tenho que aproveitar, já que essa garota nunca quer sair de seu cantinho escuro em seu quarto.
Bem, depois nos vemos então...
Agora eu vou tentar me lembrar de como uma pessoa normal vive. È isso aí, deseje-me sorte! Até mais, amigão, te vejo mais tarde!

Ah, só mais uma coisa, lembre-se sempre dessa palavra: esperança!

Agora assim, tenho que ir antes que Inna corte meu pescoço. Desejo a você um ótimo dia!

Com amor,
May Richard Crommwell. – A bruxa da fé.

A última nuvem (parte 1) (3 de 3 - Fim de Temporada)

Gente, sinto muito ter demorado tanto para postar a continuação, mas é que a escola está matando todos... Malditos encarnados! auhsauhsuha . Bom, aqui está a continuação, espero que gostem...

>> A última Nuvem : Parte 1

-SSHHHRIIIEEEEK!
Todos olharam instantaneamente para a sala dos móveis. Eles sabiam muito bem o que produzia esse som, embora não quisessem o ouvir exatamente agora.
-Paula, nós somos mais fortes que os outros, - Começou Paul. – Ficamos aqui e tentamos deter o demônio! Riley, Inna, May, Jennifer e Isa, vocês voltem de onde viemos e tentem descobrir como se abre aquela... Pedra.
-Certo! – Disse Inna, dirigindo-se a uma pequena passagem quase imperceptível ao lado da escada. – Vamos pessoal!
* * *
-CUIDADO! – Micka empurrou Tie com força quando o monstro lançou sua estranha teia na direção do garoto.
-BURNSTEIN, FAÇA ALGUMA COISA!
A aura negra avançou sem medo para o animal. Seu núcleo em forma de globo chocou-se contra o monstro, que se recolheu um pouco, e a fumaça que o cercava começou a cobrir a criatura como um casulo.
-Está dando certo? – Perguntou Mickaella, meio que para o vento.
Logo a aranha voltou a sua posição de ataque, batendo com força sua cabeça na sombra e fazendo-a parar do outro lado do salão. Burnstein, já em sua forma felina, parecia desacordado.
-Olhe! – Apontou Tie, embora não precisasse, para mostrar que o monstro dirigia-se para o gato nocauteado. – Ela vai matar Burnstein!
-Faça alguma coisa!
-Coruja...
A aura azul avançou rapidamente na direção dos dois animais, pondo-se entre ambos bem no momento que a aranha preparava suas presas. Em uma tentativa de ataque, a coruja começou a produzir sua luz azulada ofuscante, mas o monstro já esperava por isso. A aranha saltou, usando suas patas para se agarrar ao teto e ir em direção aos adolescentes, que começaram a bater desesperadamente na grande pedra que bloqueava a saída.
-NOS TIREM DAQUI! – Gritavam.
* * *
-SHRIIIIIEEEEEK!
O grande monstro saiu lentamente da sala dos móveis, quebrando uma parte da parede antiga que caiu no chão.
Paula se colocou em posição de ataque, mas permaneceu parada por muito mais tempo, enquanto Paul avançou contra o demônio, que esquivou facilmente.
-Mas que droga! – Gritou o garoto de olhos azuis meio segundo antes de bater em cheio contra a parede quebrada.
Paula não conseguia se mover. Seus músculos não a obedeciam. Ela parecia ter virado pedra...
-Sairrus, ataque!
Ao comando do homem desconhecido, o grande tigre branco avançou na direção do grande morcego, transformando-se em aura no meio do caminho. O que fez Paul e Paula terem de fechar os olhos por um instante.
Diferentemente de Sturk ou Burnstein, essa fazia a vista doer de tão clara que era. Era praticamente impossível encarar seu núcleo em forma de globo, já que o mesmo produzia uma magnífica luz branca e um pouco forte demais para olhos humanos.
A aura se chocou contra o peito peludo e esquelético do demônio, que foi arremessado com força para trás, voltando à grande sala dos móveis.
O som de muitas tábuas se quebrando foi o suficiente para fazer com que a consciência de Paula retornasse à vida. A garota observou o ambiente por rápidos e confusos três segundos, e então encarou a criatura caída no chão a poucos metros de distância. A garota percebeu que havia algo rondando o ar acima do monstro... Uma aura!
-Magia branca... – Sussurrou, com uma voz rouca, enquanto seus olhos conseguiam um vago tom avermelhado em seu núcleo.
-Paula... Paula... – Gritava Paul, enquanto se levantava lentamente e entre gemidos. Ele sabia muito bem o que estava acontecendo. – Essa não... Isso não é hora para se ter a primeira recaída...
-O que está havendo? – Perguntou o homem, dono do tigre branco.
-Se afaste! – Ordenou como resposta. – Esta tendo uma recaída. Isso é quando algum de seus sentimentos humanos se intensifica e toma conta de sua mente!
-E o que ela está prestes a sentir?
-ISSO! – rosnou a garota, dando uma volta em torno de si mesma com uma das pernas levantada. Essa acertou em cheio o rosto bronzeado do homem de jaqueta de couro preta, que secou o sangue escorrendo do canto de sua boca.
-O que essa louca...
-Ela não controla o que faz! – Advertia Paul, esquivando-se do segundo chute que, dessa vez, foi direcionado a ele. – Ela está respondendo aos seus novos instintos... E o principal deles é matar!
-Mas que ótimo! – Ironizou o homem.
Os trinta segundos que levaram na conversa os distraiu, e quando voltaram a si perceberam que o morcego tentava dilacerar o pobre tigre, que continuava a atingi-lo, ainda em seu formato de aura branca.
* * *
-BURNSTEIN! – Gritou Mickaella, desesperada, enquanto o ser gigante lançava suas estranhas teias para todo lado. Por sorte, nenhuma delas havia se enroscado nos jovens.
O gato, como aura, avançou rapidamente, chocando seu núcleo global na cabeça da aranha, que fez um som parecido com um gemido, mas então continuou avançando na direção dos adolescentes.
- CORUJA! AJUDE-NOS! FAÇA ALGUMA COISA! – Implorou Tie, enquanto empurrava Micka para um lado e se jogou para o outro no exato momento em que o monstro cravou os dentes na porta de pedra.
-ANDEM! – Micka correu para o outro canto da sala, enquanto Tie correu para o outro canto. Se fosse para morrer, pelo menos que confundissem a maldita aranha antes!
-ALGUÉM QUER ABRIR ESSA PORTA? – Gritava ele o mais alto que podia... Inútil! –Por favor...

-continua...





> O mesmo! ^^



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Episódio 15 (2 de 3 - Fim de temporada)

“Acorde com um sorriso, levante com um suspiro, desperte com um beijo.”

-O dia está tão lindo... – Disse, em um tom casual, enquanto encarava uma linda e grande árvore da lua. – Como estão seus hospedes hoje? – Eu me referia aos pequenos pássaros que construíam um ninho em um de seus galhos mais baixos.

-Querida, o lanche está pronto! – Gritou minha mãe, de nossa cozinha.

-Já estou indo! – Disse, e abri um imenso sorriso ao sentir o cheiro de seu famoso bolo de laranja. Bem, famoso pro meu estômago. – Bem... – Encarei mais uma vez o ser-vivo fixo bem na minha frente. – Tenho que ir!

Nesse instante, senti uma gota doce se chocar contra uma de minhas bochechas. Outro sorriso se abriu, e em meus olhos nasceu a ansiedade. Eu queria sentir aquela chuva. Abri os braços, e então o céu deixou que suas lágrimas tocassem o meu corpo.

No rádio, uma conhecida música do Michael Jackson parecia dançar conforme meus passos sob a chuva: “You are not alone ( Single version).”

Eu tinha a vida perfeita, e esse dia me comprovou isso. O tempo se acostumava aos meus desejos.

Gostaria tanto de voltar no tempo... Queria sentir aquelas lágrimas mais uma vez. Queria poder sorrir para minha árvore preferida, minha melhor e solitária amiga. Queria estar com minha família...

Como será que eles estão agora?

...2 meses depois...

-Espero que estejam bem... – Sussurrou Isa, enquanto encarava o gigante portador dos machados. Seus olhos não desviavam do espírito mercenário nem por um segundo sequer.

Do outro lado da jaula, Micka e Paul ainda tiravam dúvidas um do outro em questão aos últimos dias.

-Espíritos mercenários acreditam que a ausência do amor em suas vidas seja culpa de Deus, - Continuava o garoto loiro. – Por isso não suportam quando alguém começa a falar dele.

-Isso é horrível! Quer dizer... Não faz sentido.

-Tente explicar para ele! –Sorriu, apontando com o nariz para a criatura/vigia que ainda segurava firme um dos machados. O mais aterrorizante de todos.

Era um grande machado negro com algumas partes vermelhas. Queriam muito acreditar que o vermelho era tinta.

-Paul... Você já encontrou um amor?

O rapaz abaixou a cabeça e começou a rabiscar o chão com o dedo. Havia muito tempo que ninguém lhe perguntava nada parecido com isso. Embora fosse um encarnado, um coração ainda batia em seu peito. Muitas vezes, ele descumpriu as ordens de Marianne por mágoas passadas relacionadas ao amor. Mas, é claro, ele nunca contaria isso para ninguém.

-Eu prefiro acreditar que não... – Respondeu, enfim, encarando mais uma vez a garota que lhe causava certa sensação estranha.

Micka o abraçou, e um frio sobrenatural surgiu em ambos. As mãos femininas começavam a suar, enquanto as outras as apertava suavemente, e seus olhos finalmente se fecharam.

-Não ignore o que Deus lhe deu, só porque o homem lhe tirou! – Completou Mickaella.

Esta era uma experiência muito difícil. Ninguém mais agüentava ficar preso naquele inferno de jaula.

Paul suspirou.

* * *

-Isso não te interessa no momento! – Respondeu o homem, revirando seus olhos e voltando-os para seu grande mascote. – Sairrus, acabe com ela!

O Tigre expôs suas grandes presas em um rugido, e então, sem pensar duas vezes, a ação começou.

-NÃO! – Gritou May, assustada, enquanto as lágrimas escorriam freneticamente por seu rosto sujo. Ela quase enlouqueceu quando algumas gotas de sangue respingaram em sua roupa.

O animal estava fazendo um belo trabalho. Logo, não havia mais vida nenhuma naquele corpo arrebentado que ocupava espaço no antigo chão.

* * *

Um grito assustador preencheu a atmosfera. Occino, o gigante, estava caindo de joelhos no chão. Suas mãos e suas pernas estavam se desfazendo. Desaparecendo, literalmente. Logo abaixo dele,formava-se uma poça negra de sangue demoníaco.

-Para trás! – Ordenou Paul, ajudando Micka a se levantar e colocando-se a sua frente.

Logo só o que restava eram suas unhas, uma enorme calça rasgada, e diversos machados maiores do que qualquer um no grupo. Paul se aproximou de algumas grades, para ver um pouco melhor o que estava havendo.

-O que houve? – Perguntou Tie, enquanto sua coruja e Burnstein saiam com facilidade da jaula.

-Bem... A doida aracnídea não faz mais parte desse mundo! – Respondeu com um sorriso. – Ela, e seu amigo mercenário, estão literalmente mortos!

-Mortos?

-Sim, quero dizer exatamente isso! Estamos livres, vamos! Não podemos mais perder tempo!

-Ah... – Inna se encolheu ao lado de Paula e Tie assim que viu algo estranho perto do seu lado da jaula. – Na verdade, temos um novo problema!

Estava no canto de trás esquerdo: Muitas aranhas. Milhares dela. Estavam todas se amontoando, formando, aos poucos, um novo ser vivo. Onde elas subiam, nessa nova criatura, grudavam e formavam uma nova parte dela.

-Abra a jaula agora, Paul! – Disse Paula, ficando mais horrorizada do que antes. – Se continuarmos presos aqui não teremos nenhuma chance! Estamos sem espaço!

E então foi! Paul chutou a porta de grades bem no meio, fazendo ir parar longe.

-VAMOS! SEJA O QUE FOR, ESTÁ QUASE PRONTO!

Todos saíram correndo, feito desesperado. Passaram pela abertura de pedra assim que Paul e Paula trabalharam juntos para abri-lo. Em alguns segundos eles conseguiram sair do estranho salão. Haviam, de algum modo que ambos não haviam entendido, voltado para a entrada da mansão. A porta de pedra se refez e se fechou logo atrás deles, com um horrível estrondo.

-May! – Gritou Inna, e correu para abraçar a amiga que chorava. Ignorando completamente o tigre branco que rugia e o corpo sem vida no chão.

-Esperem! – Gritou Paula, chamando a atenção de todos. – Não estamos esquecendo nada?

-O que? – Inna desfez o abraço em um salto, ainda sendo possuída por uma tremedeira surreal.

Um frio percorreu a espinha de Paul.

-Onde estão Micka e Tie?

Todos se entreolharam.

-E Burnstein e aquela coruja também não estão aqui! – Completou Inna.

* * *

-SOCORRO! – Gritava Tie, enquanto batia inutilmente na grande pedra.

-NOS TIREM DAQUI. – Micka tentava, sem sucesso, prender as lágrimas que tentavam escapar de seus olhos.

Logo o novo ser havia ganhado, de fato, a vida. Era uma grande aranha azul e preta

Um pouco maior que Occino, e em sua cauda havia um enorme ferrão negro e reluzente que parecia ter sido polido para a ocasião. E suas presas... Bem, eles deveriam evitá-las a qualquer custo.

-O que vamos fazer? – Perguntou Micka, enquanto ela, Tie, e os mascotes, se viravam para encarar a aranha gigante.

-Rezar para que não tenham lhe feito um estômago!

Os dois animais se transformaram em dois globos de luz cercados por fumaça. Um negro, e outro azul.

-Temos que enrolar até alguém nos tirar daqui!

Micka Assentiu. Não tinha nada mais a se fazer.

-Vamos!

Depoimentos (J.Cast.): Espero que isso chegue até você...

As vezes, quando perdemos algo que é muito importante pra nós, nos esquecemos de que sempre resta uma parte imortal que marca pra sempre nossos corações, almas, e desejos. Quando vivemos, não ganhamos um manual de avisos ou instruções que nos prepare para o preço que viver nos custa. E mesmo que ganhássemos, de nada adiantaria.
Nunca estamos preparados para perder. Nunca estamos.
Perdas e lágrimas andam de mãos dadas, sempre invocando a saudade, afastando a felicidade. Preparadas sempre pra nos derrubar em nosso momento de maior fraqueza. Sempre nos apunhalando, não pelas costas, mas pelo sorriso. Ou a falta dele.
De qualquer forma, lágrimas não trazem o que perdemos de volta. Não, e isso é verdade. Mas elas trazem as lembranças. Trazem os sentimentos, as emoções, os olhares, os momentos. Elas nos fazem reviver com sua quentura indesejável e aconchegante.
Elas nos trazem os sonhos. E nos trazem os medos.
Mas a verdade não é o que o espelho me mostra. Você realmente não está ao nosso lado agora. Digo, Vocês não estão.
E tanta bobagem, não é mesmo? O fato de eu sentir ciúmes de você naquela época, por você passar mas tempo do que eu com a pessoa de quem eu achava que gostava. Ou gostava mesmo. E, hoje, eu queria poder sentir esse ciúme bobo de criança. Tive que saber pela televisão da sua partida. Sabia disso? Talvez por que eu estivesse afastado na época... Eu não sei. Mas eu sei de alguém que sente muito a sua falta. E por isso te escrevo agora. Não por mim, entendeu? Você sabe de quem eu estou falando! ;D Sempre vai saber, porque são suas lembranças. Eu acho que isso fica com você, não fica?
Talvez você só estivesse no lugar errado, na hora errada. De uma coisa eu sei, Deus sabe o que faz.
E sabe o que mais? Não acredito que tenha sido ele a fazer isso. Afinal de conta, ele nos deu o livre arbítrio não é mesmo? Não é culpa dele...
Faz tanto tempo, não é mesmo? Como você está? É muito diferente aí?
Bem, sinto que não posso ter essas respostas no momento... Mas um dia vamos nos ver, não é mesmo? Todos nós...
Enfim, vou deixar que descanse, okay? Tenha um infinito de luz e um tornado de amor. Abraços!!! ^^

Para todos aqueles que acham que eu não gosto de Deus!

Gente, vocês estão exagerando muito! Quem me conhece sabe muito bem que eu sou uma daquelas pessoas que reconhece uma mensagem subliminar de longe! Eu queria dizer que a coruja do Tie não é uma mensagem subliminar! Na verdade nada aqui é uma mensagem subliminar!
Eu amo Deus, Jesus Cristo, o pai eterno e único santo, acima de tudo! Eu acredito, sim, em mensagens subliminares. Mas acontece que também existem coincidências!
Então quer dizer que não pode ter coruja em lugar nenhum só por causa de um simbolo que, pessoalmente, não me diz nada? Eu AMO corujas assim como eu amo todos os outros animais desse planeta. Justamente por que foi Deus quem criou!
Enfim... Estou só descontando a raiva que uma pessoa me passou!
-Beijos, Amo vocês!! Fiquem com Deus!!! ;*

Episódio 14 (1 de 3 - Fim de temporada):

O gigante era realmente horrível visto de perto. Não que alguém ligasse muito para isso. Mas era amedrontador, principalmente quando se via todos aqueles machados que ele carregava presos à sua cintura.

-Espíritos, encarnados, bruxas, auras... – Começou a dizer Micka, bem baixinho, entre soluços. – E agora, ainda por cima, gigantes?
-Não é um gigante! – Afirmou Paul, sentado no chão ao lado da jovem, possuindo o mesmo tom de voz do da moça. – É um espírito mercenário.
-Espírito o que?
-Espírito mercenário. – Repetiu. – São espíritos daqueles que de tudo tiveram enquanto estiveram vivos, mas nunca vivenciaram um verdadeiro amor. Como um meio de fuga, esses espíritos tentam encher seu coração com coisas materiais e outras baboseiras. Mas a verdade é que nunca se satisfazem...
-Um verdadeiro amor...
-É triste admitir, mas o número dessas criaturas cresce cada vez mais...
Micka não consegue resistir. Ela espia o gigante, desta vez, com pena. Ela consegue imaginar o que é viver sem amor. Viver sem o calor do colo de uma mãe, sem o aconchego no braço dos pais. Sem beijos. Sem aqueles deliciosos arrepios na nuca toda vez que seus lábios se encontram.
Ela consegue imaginar como seria uma vida sem esperanças...
Uma vida sem cor, sem calor, sem toques.
Como resultado, uma frágil e gélida lágrima escorre por um de seus olhos.
-Quando você diz...
-Não Micka... – Ele morde fraco o lábio inferior assim que sente a agonia da menina. – Nenhum tipo de amor.
-Mas... Não é possível, Paul! Eles não têm...
-A maioria é abandonada pela família ainda bebê ou durante a infância. Quando não isso, eles simplesmente são explorados por elas. E isso cria não só um trauma no mundo dos humanos. – Ele encara a face gélida do chão de pedra por um momento. – O espírito também fica marcado... É uma cicatriz que permanece para sempre...
-Isso é... Horrível! – Sem conseguir se segurar, o rosto da jovem já estava completamente encharcado por causa das inúmeras lágrimas que agora deslizavam por ele até o seu queixo, onde se soltavam para testar a força da gravidade.
-Você está chorando? Hm, isso não é bom...
-E... Por que não?
-Ninguém chora por espíritos como... Este... – Ele apontou com o nariz para Occino, fazendo cara de nojo. – A menos que o tivessem conhecido durante a vida.
-Então quer dizer que...
* * *
-Não será assim tão fácil, otário! – Gritou a dama das aranhas, transformando-se em uma espécie de areia negra e se materializando novamente do outro lado da sala.
-Ou será que vai? – Retrucou, estalando os dedos.
Foi nesse momento que um grande tigre branco saltou em cima da bruxa, que caiu no chão.
-Conheça meu novo companheiro! – Ele a encarou enfurecidamente, enquanto ela se debatia no chão.
-Maldito! Eu vou te matar! Você vai...
-Cale-se! Sabes muito bem que auras brancas neutralizam a magia. Sua tentativa de fuga é inútil. Agora, diga: Onde estão os escolhidos?
Um grito encheu a atmosfera no minuto em que o tigre rugiu. Parada, entre a sala dos móveis e a escada, estava uma jovem de cabelos lisos que carregava um cachorro no colo. Parecia estar desperta há pouco tempo, mas estava bastante atenta a tudo.
* * *
-Está se sentindo melhor? – Tie se sentou entre Inna e Paula, que acariciava a coruja, sentindo o arrepiante frio que era o chão daquele local. – Você foi arremessada no chão muitas vezes...
-Tie... – A garota de roupas sujas e rasgadas não parecia ter prestado atenção à pergunta do garoto. – Acha que sobreviveremos? Acha que temos alguma chance de ter uma vida normal outra vez?
-Eu acho que Deus sempre tende a nos dar presentes brilhantes em caixas amassadas!
-Eu... Eu não entendi.
-Somos fortes, Inna! Mais fortes do que todos pensam...
Era incrível como Tie ainda tinha esperanças de um mundo melhor, pensava a jovem. Quer dizer, eles estavam presos em uma jaula para elefantes, sendo vigiados por um... Gigante... E, ainda por cima, sendo perseguidos por espíritos e outras criaturas que desejavam seus corpos desesperadamente. E, mesmo assim, Tie acreditava que conseguiria sorrir outra vez.
-Onde você encontra tanta felicidade assim?
-Do que você está falando?
-Olhe em sua volta, Tie! – Ordenou, fazendo ela mesma a ação. – Estamos aprisionados! Tie, quando aquela mulher voltar, todos nós morreremos. Você sabe disso, sabe que ela nos matará. E, no entanto, continua sorrindo como...
-O que você quer levar?
-Anh... Desculpe-me mas... Eu não entendi.
-Quando morrer, Inna, o que você quer levar com você? Os lindos momentos que todos nós tivemos juntos, ou a agonia que sentiu antes de morrer?
-Você...
-Eu não quero lembrar como foram meus últimos minutos de vida... Eu não quero lembrar o quanto eles me maltrataram antes de me matar de vez... Eu só quero lembrar, Inna, de vocês! De tudo que passamos, de todos os sorrisos, de todos os abraços...
-Eu não consigo pensar assim.
-Não tem que pensar... Tem que viver!
* * *
-Quem é você? – Perguntou o homem misterioso, ainda enfurecido.
-M...M...May... May Rich… Richard Crommwell.
-Crommwell? – E então o homem largou o facão, deixando cair e bater no chão, arranhando-o um pouco, esquecendo-se completamente da mulher que seu tigre branco prendia. – Você é a descendente das Crommwell?
-E...E... E você q...Q... Quem é?
* * *
-Por quanto tempo você vai continuar fingindo que não está acontecendo nada entre você e Riley? – Paul continuava sentado no mesmo local, ainda conversando com Micka, que agora apoiava sua cabeça no ombro do rapaz.
-Eu não sei o que está havendo... É só que... Eu não sei mas se sinto a mesma coisa que sentia uma semana atrás. Perdeu o sentido.
-Talvez nunca houvesse tido um sentido.
-O que?
-O amor é complicado, Micka. É muito contraditório. È a coisa mais leve do mundo, mas pode te criar um super peso na consciência. Quero dizer, amor que é amor, não se acaba.
-E como eu vou saber quando é “amor” de verdade?
-Você nunca vai saber. A não ser que sinta ele se desfazer. Se isso acontecer, pode ter certeza de que não passou de uma paixão prolongada pelo desejo de amar. Amor que é amor, é imortal. Infinito.
-Eu acho que o amor pode sim acabar!
-Ah, é mesmo? Então você esta querendo dizer que um dia Deus pode sumir?
-Não foi isso que eu disse!
-Micka, pense comigo: Se você acha que o amor verdadeiro pode acabar, está sugerindo que qualquer dia desses Deus pode desistir de nós! Está dizendo que Deus pode deixar de nos amar...
-Não! Eu sei que Deus não vai nos abandonar nunca! Se bem que... Poderíamos cuidar melhor das coisas que ele cria.
-Isso é verdade!
-GROOOOOOAAAAAAAAAAR! – Occino, neste momento, segurou com força um de seus machados e o chocou contra algumas grades de ferro da jaula.
* * *

Episódio 13 (Parte final):

* * *

-Já capturamos o metidinho e sua namorada, a mulher e sua sobrinha, o encarnado, os dois mensageiros, e a taradinha de namorado morto! - Sussurrou a dama das aranhas, apontando para uma enorme jaula para elefantes onde se encontravam Riley, Micka, Jennifer, Isa, Paul, Tie, Inna, Paula, Burnstein, e a coruja de Tie. - Bom trabalho... Mas ainda não está perfeito!

A sua frente, dois homens, sujos e de aparência cansada, recebiam as ordens com muita atenção. Deviam ter mais ou menos uns vinte e cinco anos, mas aparentavam ter uns quarenta.

Todos estavam em um enorme salão. Feito a base de pedras e ouro muito antigo. Grandes pilastras com hieróglifos se levantavam do chão e sustentavam o teto repleto de estalactites. A jaula estava posicionada bem no centro do salão, onde grandes círculos com milhares de imagens de mortes horríveis se encontravam espalhadas por todo o ele. A iluminação se resumia as várias dúzias de tochas, acesas, presas às paredes.

-Agora, - Continuou a mulher. - Chegou a segunda parte do plano: Matar a maldita bruxinha! Rápido. Se tivermos sorte, conseguiremos o espanhol como brinde!

-Entendido! – Sussurrou, impaciente, um dos homens. E então ele e seu colega, cujo corpo era infestado de cicatrizes, empurraram, juntos, uma grande pedra. Revelando, assim, a saída.

-NOS DEIXE SAIR!- Gritava Paul enfurecidamente, provocando maléficas gargalhadas de prazer na mulher. Suas veias, devido à força utilizada para tentar entortar as grades da jaula, estavam exageradamente visíveis.

-DEIXE MAY EM PAZ! – Completavam Micka e Tie.

-Ah, eu sei que me amam, mas terei que dar uma rápida saída! – E então se virou de costa para todos, passando a encarar a saída. – Occino, observe-os durante minha ausência!

-Groaaaaar! – gritou alguém.

-O que foi isso? – Sussurrou Inna, de dentro da grade.

E então apareceu, saltando sei lá de onde e aterrissando bem perto da grande jaula. Devia medir pelo menos três metros de altura, e pesar uns cento e cinqüenta e três quilos. Aparentava ser um homem. Usava uma calça jeans e um cinto, onde havia todo tipo de machado. Desde os mais afiados e amedrontadores até os mais simples e antigos. Seus olhos continham um vermelho intenso, e sua pele estava mal cuidada.

-Acha que consegue nos tirar daqui? – Sussurrou Tie para sua coruja enquanto Occino, o gigante, se aproximava.

-Se alguém tentar alguma gracinha, já sabe o que fazer! – Completou, e então se retirou do grande e antigo salão, deixando os heróis sozinhos com o gigante.

-Urrrr..

* * *

-Agora falta muito pouco... – Gritou a mulher das aranhas, rindo histérica e maleficamente.

-Não enquanto eu estiver aqui! – retrucou Alguém , enquanto cravava um facão enferrujado no peito da bruxa. – Morra sua desgraçada!

 

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