Episódio 14 (1 de 3 - Fim de temporada):

O gigante era realmente horrível visto de perto. Não que alguém ligasse muito para isso. Mas era amedrontador, principalmente quando se via todos aqueles machados que ele carregava presos à sua cintura.

-Espíritos, encarnados, bruxas, auras... – Começou a dizer Micka, bem baixinho, entre soluços. – E agora, ainda por cima, gigantes?
-Não é um gigante! – Afirmou Paul, sentado no chão ao lado da jovem, possuindo o mesmo tom de voz do da moça. – É um espírito mercenário.
-Espírito o que?
-Espírito mercenário. – Repetiu. – São espíritos daqueles que de tudo tiveram enquanto estiveram vivos, mas nunca vivenciaram um verdadeiro amor. Como um meio de fuga, esses espíritos tentam encher seu coração com coisas materiais e outras baboseiras. Mas a verdade é que nunca se satisfazem...
-Um verdadeiro amor...
-É triste admitir, mas o número dessas criaturas cresce cada vez mais...
Micka não consegue resistir. Ela espia o gigante, desta vez, com pena. Ela consegue imaginar o que é viver sem amor. Viver sem o calor do colo de uma mãe, sem o aconchego no braço dos pais. Sem beijos. Sem aqueles deliciosos arrepios na nuca toda vez que seus lábios se encontram.
Ela consegue imaginar como seria uma vida sem esperanças...
Uma vida sem cor, sem calor, sem toques.
Como resultado, uma frágil e gélida lágrima escorre por um de seus olhos.
-Quando você diz...
-Não Micka... – Ele morde fraco o lábio inferior assim que sente a agonia da menina. – Nenhum tipo de amor.
-Mas... Não é possível, Paul! Eles não têm...
-A maioria é abandonada pela família ainda bebê ou durante a infância. Quando não isso, eles simplesmente são explorados por elas. E isso cria não só um trauma no mundo dos humanos. – Ele encara a face gélida do chão de pedra por um momento. – O espírito também fica marcado... É uma cicatriz que permanece para sempre...
-Isso é... Horrível! – Sem conseguir se segurar, o rosto da jovem já estava completamente encharcado por causa das inúmeras lágrimas que agora deslizavam por ele até o seu queixo, onde se soltavam para testar a força da gravidade.
-Você está chorando? Hm, isso não é bom...
-E... Por que não?
-Ninguém chora por espíritos como... Este... – Ele apontou com o nariz para Occino, fazendo cara de nojo. – A menos que o tivessem conhecido durante a vida.
-Então quer dizer que...
* * *
-Não será assim tão fácil, otário! – Gritou a dama das aranhas, transformando-se em uma espécie de areia negra e se materializando novamente do outro lado da sala.
-Ou será que vai? – Retrucou, estalando os dedos.
Foi nesse momento que um grande tigre branco saltou em cima da bruxa, que caiu no chão.
-Conheça meu novo companheiro! – Ele a encarou enfurecidamente, enquanto ela se debatia no chão.
-Maldito! Eu vou te matar! Você vai...
-Cale-se! Sabes muito bem que auras brancas neutralizam a magia. Sua tentativa de fuga é inútil. Agora, diga: Onde estão os escolhidos?
Um grito encheu a atmosfera no minuto em que o tigre rugiu. Parada, entre a sala dos móveis e a escada, estava uma jovem de cabelos lisos que carregava um cachorro no colo. Parecia estar desperta há pouco tempo, mas estava bastante atenta a tudo.
* * *
-Está se sentindo melhor? – Tie se sentou entre Inna e Paula, que acariciava a coruja, sentindo o arrepiante frio que era o chão daquele local. – Você foi arremessada no chão muitas vezes...
-Tie... – A garota de roupas sujas e rasgadas não parecia ter prestado atenção à pergunta do garoto. – Acha que sobreviveremos? Acha que temos alguma chance de ter uma vida normal outra vez?
-Eu acho que Deus sempre tende a nos dar presentes brilhantes em caixas amassadas!
-Eu... Eu não entendi.
-Somos fortes, Inna! Mais fortes do que todos pensam...
Era incrível como Tie ainda tinha esperanças de um mundo melhor, pensava a jovem. Quer dizer, eles estavam presos em uma jaula para elefantes, sendo vigiados por um... Gigante... E, ainda por cima, sendo perseguidos por espíritos e outras criaturas que desejavam seus corpos desesperadamente. E, mesmo assim, Tie acreditava que conseguiria sorrir outra vez.
-Onde você encontra tanta felicidade assim?
-Do que você está falando?
-Olhe em sua volta, Tie! – Ordenou, fazendo ela mesma a ação. – Estamos aprisionados! Tie, quando aquela mulher voltar, todos nós morreremos. Você sabe disso, sabe que ela nos matará. E, no entanto, continua sorrindo como...
-O que você quer levar?
-Anh... Desculpe-me mas... Eu não entendi.
-Quando morrer, Inna, o que você quer levar com você? Os lindos momentos que todos nós tivemos juntos, ou a agonia que sentiu antes de morrer?
-Você...
-Eu não quero lembrar como foram meus últimos minutos de vida... Eu não quero lembrar o quanto eles me maltrataram antes de me matar de vez... Eu só quero lembrar, Inna, de vocês! De tudo que passamos, de todos os sorrisos, de todos os abraços...
-Eu não consigo pensar assim.
-Não tem que pensar... Tem que viver!
* * *
-Quem é você? – Perguntou o homem misterioso, ainda enfurecido.
-M...M...May... May Rich… Richard Crommwell.
-Crommwell? – E então o homem largou o facão, deixando cair e bater no chão, arranhando-o um pouco, esquecendo-se completamente da mulher que seu tigre branco prendia. – Você é a descendente das Crommwell?
-E...E... E você q...Q... Quem é?
* * *
-Por quanto tempo você vai continuar fingindo que não está acontecendo nada entre você e Riley? – Paul continuava sentado no mesmo local, ainda conversando com Micka, que agora apoiava sua cabeça no ombro do rapaz.
-Eu não sei o que está havendo... É só que... Eu não sei mas se sinto a mesma coisa que sentia uma semana atrás. Perdeu o sentido.
-Talvez nunca houvesse tido um sentido.
-O que?
-O amor é complicado, Micka. É muito contraditório. È a coisa mais leve do mundo, mas pode te criar um super peso na consciência. Quero dizer, amor que é amor, não se acaba.
-E como eu vou saber quando é “amor” de verdade?
-Você nunca vai saber. A não ser que sinta ele se desfazer. Se isso acontecer, pode ter certeza de que não passou de uma paixão prolongada pelo desejo de amar. Amor que é amor, é imortal. Infinito.
-Eu acho que o amor pode sim acabar!
-Ah, é mesmo? Então você esta querendo dizer que um dia Deus pode sumir?
-Não foi isso que eu disse!
-Micka, pense comigo: Se você acha que o amor verdadeiro pode acabar, está sugerindo que qualquer dia desses Deus pode desistir de nós! Está dizendo que Deus pode deixar de nos amar...
-Não! Eu sei que Deus não vai nos abandonar nunca! Se bem que... Poderíamos cuidar melhor das coisas que ele cria.
-Isso é verdade!
-GROOOOOOAAAAAAAAAAR! – Occino, neste momento, segurou com força um de seus machados e o chocou contra algumas grades de ferro da jaula.
* * *

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