Episódio 8

A noite havia chegado.
Lá no céu, cercada por lindas e brilhantes estrelas, estava ela. Ela havia chegado, e trazia em seu corpo o mais magnífico brilho de todos os tempos. A lua minguante.
Portas trancadas e janelas bloqueadas por móveis diversos. Esse era o estado da casa de Micka. Estavam todos reunidos no centro da sala, cada um com uma lanterna e celulares recarregados. Jennifer espalhava sal grosso por toda a casa, enquanto May soltava seu pequeno poodle, de nome Thor, de sua pequena casinha.
-É o seguinte: celulares no modo vibratório e nada de se separar pela casa a menos que seja caso de vida ou morte! – Jennifer abre uma das gavetas da cômoda, e retira oito crucifixos de madeira. Ficando com uma e repassando as outras, uma para cada um.
-Crucifixos? – Micka cruzou os braços. – Mãe, são espíritos, não vampiros!
-Alguém, pelo amor de Deus, pode me explicar o que está havendo? – Isa, sem nenhuma sombra de dúvidas, estava realmente perdida. Afinal, ela chegou depois de toda a história. – Pra que isso tudo? E que história é essa de espíritos e vampiros?
-Deixe eu te explicar... – Paula segurou os ombros da jovem. – May é descendente de bruxas, querem o sangue dela, querem possuí-los e isso pode incluir você. Mais o quê? Ah, durante a estadia da lua minguante estamos em completa desvantagem, ou seja, os espíritos podem te pegar e fazer coisas não muito legais com o seu corpo...
-O que isso quer...
Tarde demais. Uma tempestade havia se iniciado do lado de fora da casa, e todos os vidros do lado de dentro pareciam ter explodido. Isabella gritou, mesmo não acreditando muito nas palavras de Paula. Por sorte, um novo blecaute não havia ocorrido.
- Burnstein! – Inna gritou ao ver o gato preto pulando a janela que havia explodido.
A mesma janela que interrompeu o jogo espiritual...
Tie e todos os outros recuaram alguns passos. Micka puxou Isabella, completamente confusa, pelo braço.
Thor latia e rosnava sem parar para todos os lados.
-Ai meu Deus... O que é isso? – Isa estava pálida agora. Ela apontou para a escada que levava ao sótão, todos olharam (exceto Inna e Tie, que encaravam o felino.).
Haviam pessoas descendo lentamente os degraus, várias pessoas. Não... Várias almas-penadas. O único fato que comprovava isto era uma pequena porcentagem de transparência percorrendo o corpo de todos eles.
De repente, alguém avançou. Um velho, de roupas escuras e boina preta, se jogou em May. Neste instante, o gato saltou, se transformando no ar e impedindo o velho de se aproximar mais. O corpo desapareceu no ar.
Espere... Burnstein havia acabado de defender a Cromwell?
A essa altura, Jennifer percebeu que o sal grosso de nada adiantava. As estranhas pessoas continuavam a avançar, desta vez não só da escada, as almas também vinham de todos os corredores da casa. Burnstein havia voltado a sua forma animal, e se encontrava rondando os jovens.
Thor parecia não perceber a existência do gato. Ao invés disso, ele continuava latindo para as inúmeras figuras que se aproximavam. Nenhuma delas se sentia ameaçada.
-Como essas pessoas entraram aqui? – Gritou Isa, arremessando sua lanterna em uma parte da multidão. O objeto atravessou os corpos, e se espatifou na parede, do outro lado da sala.
-Precisamos sair! – Jennifer gritou. – Na rua teremos mais espaço, precisamos passar por eles!
O gato pareceu entender a fala pronunciada pela mulher. Se transformando mais uma vez, Burnstein avançou rapidamente, em direção ao Hall, fazendo toda e qualquer alma que se aproximasse dele desaparecer. Um estreito caminho se abriu entre os espíritos.
-Vamos! – Jennifer gritou, correndo pela abertura e sendo seguida pelos adolescentes e pelo cachorro até a porta de entrada. Ela rodou a chave e girou a maçaneta, saindo logo após.
Postes de luz acesos eram a iluminação do local. A sombra avançou em uma única alma presente na rua, impedindo-a de atacar Tie.
-Rápido, querida, que horas são? – Jennifer havia acendido sua lanterna, suas mãos não paravam de tremer.
-duas e meia. – Micka havia conferido em seu relógio de pulso verde fluorescente.
-Ótimo... Faltam apenas três horas e meia para o sol chegar... Temos que nos esconder enquanto isso!
Um corvo enorme sobrevoou o grupo e pousou ao lado de Burnstein, que voltara a ser um gato.
-Eu cuido destes pra vocês! – Um jovem loiro, de olhos azuis e músculos preparados para a ação, surge do outro lado da rua. – Sturk, eu ordeno que vá com eles!
-Cretino! – Inna berrou. Não que isto tivesse adiantado de alguma coisa, pois Paul já estava dentro da casa.
-Não temos tempo para discutir, garota! – Exclamou a mãe de Micka. - Temos que sair daqui!
Antes de alguém oferecer alguma resposta, a chuva havia passado de água para granizo. Um forte raio caiu próximo ao grupo, apavorando todos eles, provocando uma pequena rachadura no asfalto.
-Os Thompson não estavam viajando? – O suor liberado por May se fundia aos granizos que derretiam por todo o seu corpo. – A fazenda deles me parece um bom lugar!
-Não, ela fica muito longe daqui. Precisamos daquilo! – Riley apontou para uma alta caminhonete de quatro portas, estacionada na frente da casa de Jennifer.
- Não sei de quem é... – A mulher correu para a porta do veículo. – Mas vou fazer muito bom proveito. Podem entrando, agora!
Enquanto se sentava em um dos bancos, algo invadiu a mente de Micka: Paul devia ter deixado a caminhonete ali! Qual outra explicação para suas portas estarem destravadas e a chave preparada na ignição?
De um modo estranho e escancarado, Paul estava ajudando-os a escapar desta estranha noite. A pergunta é: Por quê?
Todos entraram no veículo, inclusive os animais. Jennifer deu a partida.
* * *
02h: 45m AM.
A tempestade não dava trégua e, agora, a neblina contribuía para isto. Jennifer dirigia apressadamente, como se não houvesse um amanha.
-O que é aquilo? – May apontou para a estrada. Havia alguém lá...
-Só pode ser mais uma dessas pragas! – Jennifer acelerou, percebendo seu erro quando um corpo bateu no capô, rachou o vidro, e foi lançado para alguns centímetros atrás do veículo. – Essa não! – Ela parou o carro em qualquer lugar, abriu a porta, e correu em direção ao corpo.
-Espere Jennifer, não podemos ficar sozinhos! – Riley abriu sua porta e saltou do carro, sendo seguido por Thor, que corria até a mulher.
-Riley, eu... – Duas batidas de portas e o som de uma trava sendo ativada impediu que Micka completasse a frase.
-O que está havendo? – Se continuasse desse jeito, Isa enlouqueceria.
A chave girou novamente na ignição, sozinha.
-Ai meu Deus... – Jennifer continuava agachada, observando o que agora lhe parecia ser uma mulher. – Acho que está morta!
-Jennifer... – Riley seguiu os latidos do cão. Ouvindo algo acelerar logo em seguida. – Temos problemas maiores agora. – O jovem apontou para a caminhonete, que disparou, desaparecendo na escuridão da noite.
-Crianças! – Ela gritou, levantando-se e olhando para o asfalto vazio.
-Ah... – O corpo gemeu no chão, chamando a atenção das duas figuras em pé na sua frente.
-Está viva! – Riley disse.
A mãe de micka assentiu.
-Como é bom... – A mulher ensangüentada se levantou lentamente do chão, e se refez. – Voltar...
Jennifer e Riley se entreolharam. Thor avançou na mulher, que o jogou para longe com um simples chute.
Riley correu até o cão, segurando-o em seus braços.
-Acabei de voltar... Não posso correr riscos. – A mulher segurou Jennifer pelo pescoço. –Sabe, seu corpo é ideal para minha filha...
-Pena que ela jamais o terá! – Alguém perfurou o corpo possuído, que caiu no chão, soltando Jennifer.
Riley encarou a figura portadora de um facão de churrasco. Era um homem... Era mesmo um homem, e não um adolescente, para variar.
Um homem nem tão alto, de cabelos cor de bronze e pele parda. Suas vestimentas não passavam de um antigo uniforme militar.
-Esses maníacos de hoje em dia... – O homem cobriu o facão ensangüentado com um pequeno pedaço de pano branco, guardando-o na mochila que carregava nas costas logo após. – Vocês estão bem?
Jennifer nada respondeu. Algo lhe intrigava naquele homem... Pensando bem, como não haviam percebido sua presença antes? De onde este ser tinha saído?
-Quem é você? – Jennifer aproximou-se de Riley, que ainda portava Thor em seus braços.
Um certo tom de desconfiança/ameaça/desespero emanava da voz da mulher.
As minúsculas pedras de granizo que antes se soltavam do céu, agora haviam desaparecido quase que por completo. Pelo menos, os raios e trovoadas haviam deixado de existir naquele local.
-Corbin Sant’Lhianna... – O homem de olhos negros se identificou, sem se aproximar. – 30 anos, solteiro, nascido na Espanha... O que mais precisa saber?
O cão voltou a latir.
- O que é você? – Jennifer gritou.
- É um encarnado... – Todos voltaram seus olhares para a mulher, de vestido de seda preto e rasteiras vermelhas, que apareceu repentinamente atrás de Riley. – E dos bem fraquinhos... Encarnados de verdade não precisam de facas!
-Você! – Jennifer gritou. Se aproximando do homem e puxando o jovem garoto para longe da moça. – A mulher da caverna!
-Marianne, obrigado... – A figura de vestido revirou os olhos, encontrando os de Corbin logo em seguida. - Um encarnado que ajuda os humanos... Isto está se tornando freqüente!
-Minha missão é impedir a cerimônia de sacrifício na guerra do eclipse... – Corbin aproximou-se de Marianne. – Tenho vigiado a bruxinha de vocês há algum tempo... – Revelou, olhando fixo para os olhos de Jennifer. – Quando soube da história da lua minguante percebi que teria que entrar em ação.
-Impedir a cerimônia? – Marianne olhou para o céu, pensativa, e voltou a encarar o espanhol. – Teremos problemas...
* * *
-Alguém pegue o volante... – Isa tapava os ouvidos com as mãos, e se encolhia no banco. – Por favor!
A caminhonete estava em alta velocidade. Burnstein, com os dentes, tentava rodar a chave, para desligar o carro. Tentativas fracassadas. Havia um forte campo de força em volta da ignição.
-Ninguém aqui possui habilitação, Isabella! – May gritou em resposta.
-E quem é que liga para isto? Por acaso o volante parou de rodar quando você disse “não tem ninguém dirigindo”?
-Droga! – Micka pulou para frente, expulsando o gato para o banco de carona, e segurando o volante. – Não tem como... Algo o está prendendo...
-Os freios, Micka! – Tie gritou.
Mickaella avistou o pedal, e pisou fundo. Os freios do veículo neutralizavam, aos poucos, a aceleração da caminhonete. O asfalto se encheu de fumaça e um forte cheiro de algo queimando encheu o ar.
Em alguns segundos, o carro havia parado. Suas rodas estavam completamente gastas, o vidro da frente estava rachado, e parte do capô havia sido amassada, mas o carro ainda estava inteiro.
-graças a Deus! – Exclamou Isabella.
-Não comemore... – Tie batia repetidamente em uma das portas. – Ainda estamos presos!
Sturk saltou para fora do carro, quebrando um dos vidros.
-Estão mesmo nos ajudando... – Micka ainda sentia-se incomodada. Algo nesta história não estava certo.
Tie esticou seu braço até conseguir destravar a porta.
- Vamos! – O garoto saiu do carro, destravando as outras portas logo após.
Todos saltaram do veículo.
-Micka, tem horas? – May era uma das poucas no grupo que não havia perdido sua lanterna, e a usava agora.
-03:14! – Micka voltou a apertar seu crucifixo. – Ainda falta bastante tempo... Não vamos conseguir...
-Temos que encontrar o caminho de volta. – Tie sugeriu.
-Impossível... A caminhonete pegou vários atalhos e caminhos alternativos... Apesar de eu não saber para onde... – Isa havia libertado sua parte observadora há alguns minutos, quando toda a sua vida havia passado diante de seus olhos.
-Tudo bem: Estamos oficialmente perdidos... Em todos os sentidos. – Inna demonstrava ter perdido a paciência. Sua cabeça latejava, e seu coração respondia com intermináveis batidas por segundo.
* * *
-Sabe... – Marianne se aproximava aos poucos. – Minha missão é garantir que o sacrifício aconteça, e ter certeza de que nenhum palhaço tente impedir a guerra!
A cada passo dado por Marianne, mais alto rosnava Thor. Era perceptível sua sensibilidade espiritual.
-Puxa... Vamos mesmo ter problemas... – Corbin ordenou que Jennifer e Riley ficassem atrás dele. Ordem cumprida! – Mesmo que a guerra do eclipse aconteça isso não quer dizer que minha mestra não esteja se preparando...
-O que quer dizer?
-Somos um exército, entendeu? – Corbin encarou Marianne. – Um exército de encarnados guiados por uma união do poder de cinco bruxas!
-Cinco bruxas? – Marianne parou. – Eu não sabia que alguém pudesse ser transformado por magia.
-A magia pode fazer bastante coisa, Cara dama...
A discussão é interrompida por um som. Um telefone. O celular de Jennifer.
Ao identificar o número de Micka, ela atendeu em um flash.
-Alô? Mãe? Onde vocês estão? Estão bem?
-Filha... Mais ou menos... Estamos no meio da estrada, e vocês?
-Não sabemos, em alguma outra parte deserta da estrada... Não tem nada aqui... Apenas uma placa em branco.
-Não se preocupe filha, encontramos ajuda... Pelo menos eu acho, em breve estaremos juntos novamente!
-O que eu faço mãe? Estamos desesperados!
-Corram para o fim da estrada, ela não é muito longa, se voltarem de onde vieram todos os caminhos dão em Boston.
-Tudo bem, preciso desligar, acho que Isa se feriu.
-Mande beijos e sorte para todos!
A ligação foi perdida.
-Micka? Filha?
-Por enquanto, meu assunto é com vocês... Dos jovens eu cuido depois! – Marianne esticou a mão, e o antigo celular de Jennifer havia sido lançado para longe. – Corbin e eu precisamos ter uma conversinha...
* * *

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